TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

179 ACÓRDÃO N.º 75/10 c) a disponibilidade de acompanhamento psicológico durante o período de reflexão; d) a disponibilidade de acompanhamento por técnico de serviço social, durante o período de reflexão. Por estas notas essenciais, pode concluir-se que o sistema português se distancia do alemão, na medida em que não contém qualquer injunção expressa dirigida aos profissionais intervenientes na consulta, no sentido de esta dever ser orientada pelo objectivo de dissuasão da intenção abortiva. Ora, resulta de determinado segmento das alegações do pedido que uma solução análoga à do direito alemão é considerada – com expressa citação da decisão do Tribunal Constitucional desse país acima referida – como imprescindível para realizar “o equilíbrio possível” entre o valor da liberdade da mãe e o da vida “em devir”. Justifica-se, assim, que, aqui chegados, concentremos neste ponto a questão de constitucionalidade que nos ocupa, reduzindo-a à questão de saber se aquele traço distintivo entre os dois sistemas representa também, face à nossa Constituição, a inultrapassável linha de fronteira de uma disciplina constitucional- mente conforme. O que, noutros termos, cumpre avaliar é se tem que transparecer explicitamente da semân- tica do texto normativo a finalidade dissuasora da consulta, como garantia ineliminável da sua efectiva actuação nesse sentido e, desse modo, como exigência do cumprimento pelo Estado do mínimo de tutela que lhe incumbe. 11.4.15. O nosso legislador revelou transparentemente a finalidade da consulta, ao dispor que ela se destina a “facultar à grávida o acesso à informação relevante para a formação da sua decisão livre, consciente e responsável” [alínea b) do n.º 4 do artigo 142.º do Código Penal, na nova redacção]. Mas daí não pode inferir-se, sem mais, que a consulta é puramente informativa, no sentido de ficar excluída, ao menos como efeito reflexo, indirecto, ou consequencial, qualquer outra dimensão operativa. Há que atentar, na verdade, que a informação não constitui um fim em si, mas antes um meio para uma tomada de decisão, não só livre, como consciente e responsável. Se é assim, o que importa é avalizar ou não este desígnio como compaginável ainda com o cumprimento do dever de protecção e, num segundo momento, mas inextrincável do primeiro, ajuizar da suficiência dos mecanismos predispostos, e, em particular, do momento, conteúdo e modo da informação a prestar, para alcançar objectivos que ultrapassem a mera tomada de conhecimento de certos dados. Com isto, queremos acentuar que uma valoração ajustada ao alcance real do regime concretamente estabelecido não pode ser obtida mediante um simples jogo de contraposição de agrupamentos categoriais, definidos em abstracto e concebidos em relação de mútua exclusão, sem admissão de manifestações grada- tivamente intermédias. Não é num processo subsuntivo de integração no grupo dos chamados “sistemas de mera informação” ou no grupo dos “sistemas dissuasores”, por razões de índole predominantemente nomi- nalista, que poderemos fundar uma segura resposta negativa ou positiva de constitucionalidade, dependente que ela está de um critério eminentemente graduável, como é a eficiência dos instrumentos de protecção. Para isso, é indispensável atender à estruturação objectiva da interacção comunicativa a estabelecer com a grávida e à resultante intelecção, por esta, do seu significado. Ora, pode afirmar-se que o complexo de elemen- tos informativos a disponibilizar à grávida, numa consulta de carácter obrigatório, organizativamente integrada num complexo de trâmites prévios e sucessivos, tem como efeito objectivo a sua consciencialização do valor da vida que transporta em si (ou, pelo menos, resulta ser visto pela própria como uma tentativa nesse sentido). Esse conjunto de passos a dar, num percurso integrado por um aconselhamento e culminado por um período suspensivo da prática do acto interruptivo da gravidez, destila iniludivelmente um sentido enfatizador da gravidade da decisão a tomar e suficientemente sinalizador da valoração, pelo ordenamento jurídico, do bem da vida. E o encorajamento para uma tomada de decisão que o preserve é implicitamente dado quando se pro- porciona à grávida o conhecimento de uma série de apoios de que pode beneficiar. Daí que, o não ser a consulta declarada e ostensivamente orientativa não impõe, ipso facto , a sua qualificação como meramente informativa, como despida de qualquer intenção de favorecimento da decisão de prosseguir a gravidez. Merece destaque, nesta perspectiva de cumprimento do dever de tutela, o disposto na alínea b) do artigo 2.º da Lei n.º 16/2007, segundo o qual a grávida deve ser informada das “condições de apoio que o

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