TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
191 ACÓRDÃO N.º 75/10 no ordenamento jurídico‑penal português as chamadas “causas de exclusão da ilicitude”, correspondentes ao modelo de indicações. Tal orientação é de manter no âmbito da fattispecie prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 142.º do Código Penal, na redacção introduzida pelo artigo 1.º da Lei n.º 16/2007, de 17 de Abril. Na verdade, a colocação da possibilidade de realização da interrupção voluntária da gravidez, com sujeição ao regime previsto nessa norma, na dependência do assentimento de ambos os progenitores não poderia deixar de equivaler à atribuição ao progenitor masculino de um direito de veto. Não sendo concebível a previsão da possibilidade de recurso aos tribunais para dirimir uma eventual divergência entre a grávida e o progenitor acerca da realização, nos termos previstos na alínea e) do n.º 1 do artigo 142.º do Código Penal, de uma interrupção da gravidez desejada pela primeira e indesejada pelo segundo, um princípio de direcção conjunta do destino do embrião ou do feto redundaria aqui na atribuição ao progenitor da prerrogativa de, por acto unilateral e discricionário, impedir a aplicação daquela alínea e, com isso, reconvocar a protecção do direito penal, submetendo, com isso, a grávida à ameaça da pena – apesarde esta ter sido considerada, pelo legislador de 2007, instrumento não necessário de tutela da vida intra-uterina até às 10 semanas de gravidez. Deste ponto de vista, pode dizer-se que a solução normativa consistente na inexigibilidade do consen- timento do progenitor para a realização da interrupção da gravidez prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 142.º do Código Penal não envolve qualquer desqualificação arbitrária da paternidade enquanto valor social eminente, nem se apresenta carecida de justificação objectiva e racional, em termos de poder ser considerada violadora do princípio da igualdade. A solução está, por assim dizer, na “natureza das coisas”, por condicio- nada pela realidade biológica da gestação humana. Sendo assim, é de concluir que a norma extraída dos n. os 1, alínea e) , e 4, alínea b) , do artigo 142.º do Código Penal, na redacção do artigo 1.º da Lei n.º 16/2007, de 17 de Abril, consistente na suficiência do consentimento da mulher grávida para a exclusão da punibilidade da interrupção da gravidez efectuada por opção daquela, em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido e por médico ou sob a sua direcção, dentro das 10 primeiras semanas de gravidez, dispensando o do progenitor, não deve ser conside rada inconstitucional. 11.9. Não participação na consulta obrigatória dos médicos que invoquem a objecção de consciência relativamente a qualquer dos actos respeitantes à interrupção voluntária da gravidez (artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 16/2007) 11.9.1. Os requerentes suscitam ainda a inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 16/2007, de 17 de Abril, na medida em que exclui das consultas previstas na alínea b) do n.º 4 do artigo 142.º do Código Penal e no artigo 2.º daquele diploma os médicos objectores de consciência. Segundo os requerentes, tal solução normativa encontra-se em desconformidade com o artigo 24.º da CRP, violando ainda os artigos 13.º (princípio da igualdade), 25.º, n.º 1 (integridade pessoal dos médicos), e 26.º (bom nome e reputação dos médicos), para além de desconforme à Declaração Universal dos Direitos do Homem e Convenções Internacionais, aplicáveis por força do artigo 8.º da CRP. De acordo com a argumentação para o efeito desenvolvida, a disciplina constante da norma em questão, ao excluir das consultas os médicos objectores de consciência – e, por isso, mais próximos da principiologia do artigo 24.º da Constituição –, contém, relativamente a estes, um tratamento discriminatório, designada- mente no que toca ao acesso a cargos em estabelecimentos públicos. O artigo em causa, sob a epígrafe “objecção de consciência”, dispõe, no seu n.º 2, o seguinte: “2 - Os médicos ou demais profissionais de saúde que invoquem a objecção de consciência relativamente a qualquer dos actos respeitantes à interrupção voluntária da gravidez não podem participar na consulta prevista na
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=