TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

238 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (apontam-se depois, a titulo exemplificativo, algumas diferenças, e, entre elas, destaca-se, quanto ao recrutamento e selecção dos trabalhadores no sector público e no sector privado, “a que decorre do preenchi- mento de um lugar do quadro de pessoal de um qualquer organismo público resultar de um acto de nomea- ção” e de o artigo 47.º, n.º 2, da Constituição assegurar a via do concurso). Do mesmo Acórdão n.° 683/99 constam, ainda, passagens do Acórdão n.° 340/92 ( Diário da República , II Série, de 17 de Novembro de 1992), podendo ler-se numa delas o seguinte: «A Administração, (…), é livre para estabelecer as respectivas formas de organização ou os meios pelos quais se hão-de satisfazer as necessidades que constituem a sua razão de ser. Simplesmente, esta liberdade não pode ser entendida no sentido de, a propósito das formas de provimento dos funcionários públicos, conduzir a uma supres­ são infundamentada dos seus vínculos de efectividade e permanência envolvendo a sua substituição por formas de contratação precárias, transitórias e sem qualquer expectativa de continuidade profissional.» Face a essa linha jurisprudencial do Tribunal Constitucional, entende o requerente poder, em suma, dar-se como assente que o Estado-Administração vive de estruturas e organizações permanentes que assegu- ram de modo regular e contínuo a satisfação das necessidades colectivas, qualquer que seja a intensidade e a extensão destas, e que as organizações humanas que servem o Estado-Administração supõem um direito à função pública, com o segmento de um direito ao lugar, que satisfaz a necessária estabilidade, permanência e efectividade. Também a essa luz, afirma-se que a regra de transição, consagrada no questionado artigo 88.°, n.° 4 − ainda que o legislador queira ressalvar “os regimes de cessação da relação jurídica de emprego público, de reorganização de serviços e de mobilidade especial próprios da nomeação definitiva”, mas sem que fique asse­ gurada aos interessados uma opção pelo regime anterior ou pelo novo regime, como acontece noutros casos de sucessão de regimes legais −, contraria os princípios da segurança jurídica e da confiança ínsitos na ideia de Estado de direito democrático, consagrada no artigo 2.° da Constituição, e viola os artigos 53.º e 58.° da mesma Constituição, que garantem o direito à função pública e o segmento do direito ao lugar, como ficou dito no texto. Isto porque os actuais trabalhadores nomeados definitivamente são surpreendidos por uma mudança do seu estatuto profissional, que lhes é desfavorável, e que, aliás, abrange um amplo universo constituído certa- mente pela percentagem mais elevada dos trabalhadores da Administração Pública. Há um investimento na confiança e na manutenção da ordem jurídica vigente que aqueles trabalhadores vêem fortemente abalado. Pode pois concluir-se que as soluções consagradas na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, atingin- do uma faixa significativa dos actuais trabalhadores da Administração Pública nomeados, estão feridas de inconstitucionalidade material, por violação, no essencial, das seguintes normas e princípios constitucionais, assim sintetizados: a) o artigo 2.°, com os princípios da segurança jurídica e da confiança que lhe estão ínsitos, envolven- do uma ideia de previsibilidade da ordem jurídica, pois, com o novo regime de vinculação e o novo modelo de esvaziamento das funções estaduais, são seriamente afectadas as legítimas e justas expec- tativas dos trabalhadores da Administração Pública, em especial, as que respeitam aos trabalhadores vinculados por acto de nomeação, que irão, muitos deles, uma maioria significativa, ao arrepio da boa fé, perder esse vínculo (e em prejuízo dos cidadãos, pois ficará afectada a realizaçãoda democra­ cia económica, social e cultural, com ofensa ainda do artigo 267.°, que espelha a estrutura da Admi­ nistração Pública, ao encontro dessa democracia);

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