TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
36 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL reservadas à Assembleia da República, por interferirem com a liberdade de associação e, assim, bulirem com direitos, liberdades e garantias. No caso da dependência dos apoios técnicos e financeiros às organizações não governamentais de ambi ente por parte da região autónoma relativamente à inscrição no registo regional, a questão controvertida é a de determinar se, e nesse caso em que medida, as normas que a estabelecem interferem no âmbito de protecção do direito de associação, mais propriamente no «momento normativo do âmbito de protecção do direito» (Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição , 7.ª edição, Almedina, Coimbra, 2003, p. 449), i. e. , no seu conteúdo jurídico-constitucionalmente protegido. Antes de se apurar se uma medida conforma ou restringe um direito fundamental, torna-se necessário começar por saber se chega a nele interferir, para isso se recortando, em termos jurídicos, o âmbito con- stitucionalmente protegido do direito fundamental, e deste modo se reconhecendo os contornos do seu conteúdo juridicamente garantido pela Constituição, i. e. , aquele que a Constituição entendeu ser merecedor de garantia. Pode adiantar-se que não se considera que as organizações não governamentais de ambiente, enquanto associações, tenham, em razão da liberdade de associação, um direito a apoio técnico e financeiro. Este, a poder considerar-se um direito, não é uma dimensão da liberdade de associação, pelo que o conteúdo consti- tucionalmente garantido desta liberdade não abrange uma garantia de obtenção destes apoios. 6.2 Ora, entende-se que a regulação que impõe a inscrição no registo como condição de acesso da asso- ciação a apoio técnico e financeiro deixa intocada a protecção jurídico-constitucional reconhecida ao direito de associação. Por outras palavras, não cabe na protecção jurídico-constitucional reconhecida à liberdade de associação um direito à atribuição de apoio técnico e financeiro à associação. Sendo a possibilidade de se candidatar a apoios apenas um aspecto que pode, ou não, ser concedido à associação, e que não integra a dimensão constitucional da liberdade de associação, antes sendo instituído para além das facetas constitucionalmente protegidas desta, não tem de ficar sujeito ao regime constitucional dos direitos, liberdades e garantias. Assim, considerando-se não haver aqui uma intervenção no conteúdo do direito de associação, não se exige, por este motivo, a intervenção da Assembleia da República. Questão na aparência semelhante foi tratada no Acórdão n.º 711/97, invocado pelo requerente. A solução, todavia, não aproveita neste caso, uma vez que na situação então em análise o parâmetro consti tucional em causa foi a falta de interesse específico. 6.3 Mesmo para quem considere que da atribuição do apoio técnico e financeiro dependerá, muitas vezes,a própria subsistência e a actividade das associações (argumentação do requerente), diga-se que o recor te constitucional da liberdade de associação não pode ter querido contemplar a atribuição de apoios, ainda que necessária à subsistência da associação, como elemento merecedor de protecção constitucional. Nem se argumente que, na falta do apoio, a associação desaparecerá, o que poderia ser visto como a imposição de uma dissolução administrativa, gravemente lesiva das garantias das associações. A liberdade de associação não obriga a Administração a conceder apoios. Tal implicaria encarar o direito de associação, direito funda- mentalmente de defesa, numa dimensão nova de direito a prestações do Estado por parte das associações (no sentido amplo de Robert Alexy: Teoria dos Direitos Fundamentais , trad. port. Virgílio Afonso da Silva, São Paulo, 2008, p. 442, abrangendo todo o direito a uma acção positiva, ou seja, a uma acção do Estado), pela via da garantia de um feixe de posições fácticas ou até normativas, protegendo a dependência destas relati- vamente aos apoios públicos. A liberdade de associação não convoca uma dimensão pela qual a associação veria reconhecido o direito a ser mantida pelo Estado, a pretexto do não condicionamento do associativismo. O «direito à própria existência», componente da liberdade de associação, significa que as associações não podem«ser dissolvidas pelos poderes públicos, nem ter as suas actividades suspensas, senão nos casos previs- tos na lei (princípio da tipicidade legal) e mediante decisão judicial». Sendo «fundamentalmente um direito
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