TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

41 ACÓRDÃO N.º 119/10 c) Recorrer contenciosamente dos actos e regulamentos administrativos que violem as disposições legais que protegem o ambiente; d) Apresentar queixa ou denúncia, bem como constituir-se assistentes em processo penal por crimes contra o ambiente e acompanhar o processo de contra-ordenação, quando o requeiram, apresentando memoriais, pareceres técnicos, sugestões de exames ou outras diligências de prova até que o processo esteja pronto para decisão final.» Mesmo sem se apurar se é reproduzido, no todo ou em parte, o disposto na Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto (Lei de participação procedimental e de acção popular), a verdade é que, por via da apropriação resultante da 1.ª parte do n.º 1 do artigo 10.º do Decreto, se toca o âmbito de protecção do direito de acção popular. Este está consagrado no artigo 52.º, n.º 3, da CRP, sendo no seu texto expressamente referida a preservação do ambiente: «3. É conferido a todos, pessoalmente ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos na lei, incluindo o direito de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização, nomeadamente para: a) Promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra a saúde pública, os direitos dos consumidores, a qualidade de vida, a preservação do ambiente e do património cultural; b) Assegurar a defesa dos bens do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais.» (itálico nosso) O Decreto cujas normas estão em crise, ao fazer referência, no seu artigo 10.º, n.º 1, 1.ª parte, aos direitos conferidos pela Lei n.º 35/98, integra no regime jurídico que disciplina as ONGA a nível regional a atribuição desta especial legitimidade processual para protecção de interesses difusos. Este direito de acção popular é um verdadeiro direito de acção judicial compreendido no catálogo dos direitos, liberdades e garantias. Como referem Jorge Miranda e Rui Medeiros (Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , Tomo I, Coimbra Editora, Coimbra, p. 498): «a amplitude da alínea a) do n.º 3 (do artigo 52.º) tor- na-se patente, na Lei n.º 35/98, de 18 de Julho, ao conferir legitimidade às organizações não governamentais do ambiente (…)». Não se trata, aqui, de um mero aspecto processual instrumental, mas da apropriação, pela legislação regional, de «uma “declinação” do direito de acção judicial (artigo 20.º)» (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 693), aqui na versão de acesso à defesa de interesses difusos. Considerando-se que a reserva de lei em matéria de direitos, liberdades e garantias abrange, não apenas as restrições, mas também as intervenções que concedam (ampliem) o direito, então, a assimilação deste direito na ordem jurídica regional, através da emissão de um decreto legislativo regional, será violadora da Constituição, nos seus artigos 165.º, n.º 1, alínea b) , 112.º, n.º 4 e 227.º, n.º 1, alínea a), por força do artigo 52.º da CRP. Mais ainda, tal assimilação também viola a reserva de competência legislativa da Assembleia da República [mas a alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP] ao integrar o disposto na alínea d) do artigo 10.º, que concede às ONGA o direito de «apresentar queixa ou denúncia, bem como constituir-se assistentes em processo penal por crimes contra o ambiente (…)». 11.5 Ao proceder à apropriação dos direitos previstos na Lei n.º 35/98, determinada pelo artigo 10.º, n.º 1, 1.ª parte, o Decreto n.º 8/2010 passa a dispor sobre isenções de emolumentos e custas e sobre im- posto de selo (artigo 11.º da Lei n.º 35/98), sobre isenções fiscais atribuídas a pessoas colectivas de utilidade pública, sobre isenções fiscais relativas a IVA (artigo 12.º da Lei n.º 35/98), e sobre benefícios fiscais resul- tantes do regime do mecenato (artigo 13.º da Lei n.º 35/98).

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