TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

107 ACÓRDÃO N.º 185/10 Assim notificada, veio a recorrente apresentar as suas alegações apenas quanto à questão colocada nos dois últimos pontos atrás mencionados, de acordo, portanto, com a delimitação do objecto do recurso fixada no despacho da Relatora. A questão de constitucionalidade ficou por isso circunscrita ao problema de saber se será ou não conforme com a lei Fundamental a norma constante do n.º 2 do artigo 225.º do Código de Processo Penal, na medida em que faz depender o direito a indemnização por prisão preventiva injustificada da ocorrência de erro grosseiro na apreciação, pelo juiz, dos pressupostos de facto de que depende a decreta- ção da medida de coacção. Sustentou a recorrida a inconstitucionalidade da exclusão da indemnização em casos como os dos autos – em que a pessoa sujeita a prisão preventiva é, a final, absolvida –, desde logo pelo valor conferido pela Constituição ao direito à liberdade. Sendo a prisão preventiva a medida de coacção que mais gravosa- mente restringe esse mesmo direito – e sendo essa restrição expressamente autorizada pela Constituição nos termos do n.º 3 do artigo 27.º –, deveria, no entender da recorrente, o legislador ordinário fazer concordar praticamente a intensidade da medida restritiva autorizada, e o sacrifício da liberdade por ela imposta, com os valores constitucionais justificativos da restrição – a saber, “a função de garante da vida em sociedade que incumbe ao Estado no exercício da acção da justiça penal”. Ora, o regime contido no artigo 225.º do Código de Processo Penal, na redacção dada pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto (e na leitura que dele fora feita pela decisão recorrida), ao restringir o dever de indemnizar do Estado aos casos de prisão ilegal ou de prisão injustificada por erro grosseiro na apreciação dos respectivos pressupostos de facto, não chegaria a realizar a referida concordância prática entre o sacrifício da liberdade e os interesses e valores constitucio- nais que legitimariam tal sacrifício, na medida em que faria com que a pessoa injustificadamente sujeita a medida de coacção que viesse a ser absolvida suportasse inteiramente, e sem nenhuma comparticipação da comunidade, os danos decorrentes da privação da liberdade. Um tal desequilíbrio nos custos da repartição do sacrifício [da liberdade] seria, ainda segundo a recorrente, quer contrário ao disposto no n.º 5 do artigo 27.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), quer contrário ao disposto no seu artigo 22.º, já que deste último preceito, directamente aplicável, decorreria o direito de cada um à indemnização por danos causados por actos lícitos da função jurisdicional de que resultasse a violação de direitos, liberdades e garan- tias. Finalmente, invocou ainda a recorrente a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, sustentando que o regime restritivo do artigo 225.º do Código de Processo Penal contradiria igualmente o disposto no seu artigo 5.º O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional contra-alegou, determinando-se pela improcedência do recurso: a norma constante do n.º 2 do artigo 225.º do CPP, na redacção emergente da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, ao estabelecer que só existe direito de indemnização no caso de prisão pre- ventiva injustificada por erro grosseiro na avaliação dos respectivos pressupostos de facto – não atribuindo tal direito ao arguido que a suportou como mero corolário ou decorrência de uma ulterior absolvição na fase de julgamento (como decorrência do funcionamento do princípio in dubio pro reo ) – não violaria o artigo 27.º, n.º 5, da Constituição, o artigo 5.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, nem qualquer outra norma ou princípio constitucional. Tudo visto, cumpre apreciar e decidir. II — Fundamentos 3. Delimitação do objecto do recurso e questão de constitucionalidade 3.1. De acordo com a redacção aplicável ao presente caso, e dada pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, dispõe o artigo 225.º do Código de Processo Penal:

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