TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

110 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dispondo o n.º 5 do artigo 5.º da Convenção que tem direito a indemnização “ [q]ualquer pessoa vítima de prisão ou detenção em condições contrárias às disposições deste artigo”, em nada a disposição acrescentaria face à já contida no artigo 27.º, n.º 5, da Constituição, pelo que não teria qualquer utilidade a apreciação, no caso, da eventual desconformidade entre a norma de direito interno e a norma da aludida Convenção. Por tudo isto, o Tribunal elege como exclusivo parâmetro de controlo o disposto nesse mesmo n.º 5 do artigo 27.º da CRP. Finalmente, em terceiro e último passo, o Tribunal conclui – convocando para tanto o Acórdão n.º 90/84 – que, encontrando-se sob reserva de lei o direito à indemnização aí previsto [no n.º 5 do artigo 27.º], deteria o legislador, quanto à conformação do seu exercício, uma larga margem de liberdade, só limi­ tada pela proibição de aniquilamento do conteúdo essencial do direito, limitação essa que apenas deferiria ao Tribunal a possibilidade de controlos de evidência. Como, no caso, não seria evidente tal aniquilamento, decide-se a final que a norma sob juízo não merece qualquer censura constitucional. Não se discute, agora, a bondade desta argumentação. Contudo, deve notar-se que, no presente caso, a recorrente invoca argumentos novos quanto à necessária aplicação, como parâmetro de julgamento, do disposto no artigo 22.º da CRP, afirmando, como já se viu, que dele decorre um direito à indemnização por danos causados por actos lícitos da função jurisdicional que impliquem violação de direitos, liberdades e garantias (como se verá adiante, esta alegação, que não poderá deixar de ser respondida, contém em si própria alguma medida de contradição). Por outro lado, importa também sublinhar que, quanto ao direito à liberdade e à segurança protegido pelo artigo 27.º da CRP – e conforme também alega, neste caso, a recorrente –, não pode o “parâmetro” aplicável reduzir-se ao disposto, textualmente, no n.º 5 do mesmo preceito. O argumento segundo o qual o legislador constituinte se terá referido aqui a um dever estadual de indemnizar apenas em casos de falta de justificação formal da privação da liberdade (“[a] privação da liberdade contra o disposto na Constituição e na lei constitui o Estado no dever de indemnizar o lesado (…)” não resolve, só por si, a questão de saber se as faltas de justificação material dessa privação não devem, também, ser compensadas por toda a comuni- dade política. Assim tomado, em estreita leitura textual, o disposto no n.º 5 do artigo 27.º seria finalmente inaplicável à norma sob juízo, que, pressupondo a legalidade da prisão preventiva, jamais poderia violar uma norma constitucional que exclusivamente dissesse respeito a situações de detenção ou prisão ilegais ou inconstitucionais . Ter-se-ia assim que concluir que o problema posto no presente recurso se situaria pura e simplesmente fora do âmbito de protecção do referido n.º 5, que só valeria, quando muito, para vincular a determinação legislativa do conteúdo e limites da prisão preventiva ilegal, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 3 do artigo 27.º O problema que se põe é, pois, outro. Em causa está a questão de saber se a tutela constitucional da ma- téria se esgota nas situações que, literalmente, o n.º 5 do artigo 27.º, prevê, questão essa que só poderá ficar resolvida se se evitar a leitura isolada daquela disposição. Antes do mais, há que ter em linha de conta que a norma se insere, sistematicamente, no preceito constitucional que tutela a liberdade e a segurança, o que não pode deixar de ser relevante para a determinação da natureza, conteúdo e alcance do direito à indemnização que o n.º 5 prevê. 4. Do artigo 27.º da CRP 4.1.   Dispõe o n.º 1 do artigo 27.º da CRP que “[t]odos têm direito à liberdade e à segurança” e o n.º 2 que “[n]inguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segu- rança”, vindo o n.º 3 admitir, excepcionalmente, a privação da liberdade nas situações aí expressamente previstas. Deixando de lado o disposto no n.º 4, que não vem ao caso, confere o n.º 5 do mesmo artigo, como já se viu, um específico direito de indemnização a todo aquele que for privado da sua liberdade contra o disposto na Constituição e na lei. Referindo-se o preceito, na sua letra , a situações de privação ilegal ou inconstitucional da liberdade, a sua última parte (situações de privação contra constitutionem ) reportar-se-á desde logo àqueles casos

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