TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

124 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Trata-se, por isso, de uma questão relevante, que implicava a impossibilidade de prosseguimento do processo e obstava, portanto, à emissão de uma pronúncia de mérito quanto à pretensão formulada pelo recorrente, e que nunca fora antes discutida no processo, e relativamente à qual o interessado, enquanto sujeito proces- sual, deveria ter tido a oportunidade de expor as suas razões em vista a convencer o tribunal a seguir diferente entendimento. Tanto mais que a solução jurídica adoptada não é, de nenhum modo, consensual nem isenta de dúvida, face aos princípios e critérios legais que resultam do regime geral de impugnação dos actos admi­ nistrativos. Não pode deixar de concluir-se, por conseguinte, que ao permitir a decisão do recurso sem a notificação prévia ao recorrente, a interpretação normativa do citado artigo 173.º, n.º 3, do EMJ, efectuada pelo tri- bunal recorrido, é violadora do direito a um processo equitativo, constitucionalmente consagrado no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República, na sua dimensão essencial de direito ao contraditório (audiatur altera pars). 3. A questão não se coloca, no entanto, nos mesmos termos em relação à não audição, no mesmo pro- cesso e relativamente à mesma questão, do magistrado do Ministério Público. De facto, o Ministério Público intervém no processo de recurso contencioso das deliberações do Con- selho Superior da Magistratura, tal como decorre do disposto nos artigos 173.º, n.º 1, e 176.º do EMJ – onde se prevê uma vista inicial do processo para suscitar quaisquer questões prévias que possam obstar ao prosseguimento do recurso e a emissão de parecer sobre o mérito da causa – numa posição de super partes e, portanto, num plano de equidistância em relação aos titulares da relação jurídica controvertida, agindo em defesa da legalidade e, assim, no uso dos poderes que lhe são conferidos estatutariamente [artigo 5.º, n.º 1, alínea f ), do Estatuto dos Ministério Público] e estão previstos na Constituição (artigo 219.º, n.º 1). O Ministério Público não é parte no processo nem tem interesse directo na demanda e a omissão da sua audição em relação a qualquer questão prévia oficiosamente suscitada pelo juiz apenas pode prejudicar a qualidade da decisão que venha a ser adoptada sobre a matéria, na medida em que se prescinde da opinião de um magistrado independente que se coloca numa posição objectiva e imparcial, e que poderia servir como uma garantia adicional de ponderação da decisão judicial. Esta possível vantagem processual não está, no entanto, coberta pelo princípio do processo equitativo. O legislador dispõe, no plano da organização do processo, de uma ampla margem de liberdade conformativa e nada obstava que pudesse até configurar o recurso contencioso como um mero processo de partes, numa perspectiva subjectivista do contencioso anulatório. De resto, o Código de Processo nos Tribunais Administra- tivos veio limitar o âmbito de intervenção processual do Ministério Público na acção administrativa especial, impedindo que este actue em defesa da legalidade processual, designadamente para o efeito de suscitar a regu- larização da petição, excepções, nulidades processuais e quaisquer questões que obstem ao prosseguimento do processo, e bastando-se com uma pronúncia “sobre o mérito da causa” e, portanto, sobre aspectos relativos à violação da lei substantiva (artigo 85.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos). Restrição esta que pode explicar-se à luz de um princípio de eficiência processual, destinado a evitar que o processo termine por decisões formais, e que pode entender-se como um dos interesses a que o legislador pode dar primazia na definição de um modelo processual. Afigura-se, pois, não ser possível estender o juízo de desconformidade constitucional ao segmento da interpretação normativa que se refere à não audição do Ministério Público relativamente à referida questão prévia. 4. Uma segunda questão de constitucionalidade vem colocada em relação à norma do artigo 169.°, n.° 2, alínea a) , do EMJ, quando interpretada no sentido de não dever ser admitida por extemporânea a impugnação de acto administrativo lesivo, sujeito a publicação em Diário da República , antes de esta ter efectivamente ocorrido, quando o procedimento administrativo foi electronicamente tramitado e o acto publicitado na página oficial da Internet da entidade recorrida. Alega-se, neste caso, ter sido violado o direito

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