TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

127 ACÓRDÃO N.º 186/10 Não podendo deixar de aceitar-se estes critérios como afloramento do due process, afigura-se ser con- trário ao princípio da tutela jurisdicional efectiva que um interessado, tendo tido conhecimento oficioso do acto através da publicitação efectuada pela própria autoridade recorrida, tenha de aguardar a publicação no Diário da República , para interpor o competente recurso contencioso, quando essa formalidade, relevando para efeito de conferir eficácia ao acto, nada mais acrescentaria quanto à cognoscibilidade do acto, nem poderia relevar para efeito da contagem do prazo de impugnação, visto que este carecia, em regra, de ser pes- soalmente notificado ao interessado. Por outro lado, a rejeição do recurso com fundamento na falta de publicação do acto impugnado no jornal oficial põe em causa a celeridade e eficiência processuais sem qualquer vantagem evidente para os in- teresses da boa composição do litígio, traduzindo-se apenas numa decisão inútil, dado que tem como único efeito obrigar o recorrente a apresentar, após a publicação do acto, a mesma petição de recurso que já havia dado entrada num momento anterior. Acresce que quando veio a ser proferido o acórdão ora recorrido – em 1 de Outubro de 2009 – a de- liberação impugnada havia já sido objecto de publicação no Diário da República – o que ocorreu em 31 de Agosto de 2009 –, circunstância a que, aliás, é feita expressa menção nesse acórdão, pelo que, na data em que foi efectuada a sua notificação à recorrente – em 9 de Outubro de 2009 – , encontrava-se já transcorrido o prazo de 30 dias cominado no artigo 169.º, n.º 1, do EMJ, quando contado a partir dessa publicação. O que significa que, na prática, a decisão recorrida coarctou objectivamente o direito ao recurso, sem qualquer justificação plausível. Neste condicionalismo, a interpretação normativa efectuada pelo tribunal recorrido afecta desneces- sariamente o direito de acesso aos tribunais e que, como tal, viola o princípio do processo equitativo na vertente da tutela jurisdicional efectiva. III — Decisão Termos em que se decide: a) Julgar inconstitucional a norma do artigo 173.°, n.° 3, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, quando interpretada no sentido de permitir a rejeição do recurso por extemporaneidade sem que previamente tenha sido dado conhecimento à recorrente para se pronunciar sobre essa questão prévia, com fundamento em violação do direito a um processo equitativo, consagrado no artigo 20.°, n.° 4, da Constituição, na sua dimensão do direito ao contraditório e de proibição de de- cisões-surpresa; b) Julgar inconstitucional a norma do artigo 169.°, n.° 2, alínea a) , do mesmo Estatuto, quando interpretada no sentido de que é extemporânea a impugnação de acto administrativo sujeito a publicação em Diário da República , antes de esta ter efectivamente ocorrido, quando o mesmo acto, à data da impugnação, tinha já sido publicitado, pela entidade recorrida, na página oficial da Internet, neste caso, por violação do direito a um processo equitativo, na vertente de direito à tutela jurisdicional efectiva, consagrado nos artigos 20.°, n.° 5, e 268.°, n.° 4, da Constituição; c) Determinar a reforma da decisão recorrida em conformidade com o juízo de inconstitucionalidade agora formulado. Sem custas. Lisboa, 12 de Maio de 2010. – Carlos Fernandes Cadilha – Ana Maria Guerra Martins – Maria Lúcia Amaral – Vítor Gomes (com declaração anexa) – Gil Galvão [votei a alínea b) da decisão por entender que a interpretação normativa em causa coarctou, concreta e objectivamente, o direito ao recurso, sem qualquer justificação plausível].

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