TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
134 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL tais condições de trabalho a que os trabalhadores têm direito. Ou seja, o art. 59.º n.º 2 exige um comportamento interventor do Estado nesta matéria, estabelecendo as medidas adequadas a assegurar tais condições de trabalho e sancionando os comportamentos que, por algum modo, violem tais direitos. Assim, quando o legislador pune comportamentos violadores das condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, está a cumprir uma obrigação constitucional, dirigida aos próprios poderes públicos. Ora, se no âmbito da Lei 35/2004, de 29 de Julho, existia uma estrutura sancionatória que efectivamente pretendia garantir o dever do Estado em assegurar essas condições de trabalho, no Novo CTrabalho, aprovado pela Lei 7/2009, no que respeita à higiene, segurança e saúde no trabalho, temos apenas alguns princípios gerais – arts. 281.º a 283.º – remetendo-se para regulamentação, ainda não aprovada. Assim, de uma estrutura sancionatória assegurando o efectivo cumprimento pelo Estado da obrigação imposta pelo art. 59.º n.º 2 da Constituição, passou-se para o vazio legislativo. Talvez de forma inadvertida, mas mesmo assim, violando aquela injunção constitucional. A propósito, cita-se Gomes Canotilho e Vital Moreira que, na sua Constituição Anotada , Vol. I, 4.ª ed., 2007, pág. 771, sobre o referido art. 59.º, afirmam o seguinte: «O segundo problema conexiona-se com a extensão do regime dos direitos, liberdades e garantias dos direitos económicos, sociais e culturais, quando estes tenham obtido um determinado grau de concretização ( direitos fun damentais derivados ). Trata-se, por um lado, de impedir que a exequibilidade dada a uma norma constitucional lhe seja depois retirada. Desta forma, todos os direitos constantes deste artigo beneficiam de garantia nos aspectos materiais já legalmente concretizados (ex.: o estabelecimento do salário mínimo), os quais não podem ser anulados ou restringidos (...) De resto, isto não é mais do que a aplicação concreta do regime de protecção dos direitos de origem legal (...) às concretizações legislativas dos direitos constitucionais.» Mais adiante, sobre o art. 59.º n.º 1 al. c) da Constituição, a págs. 773, organizam o seguinte comentário: «A prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde (n.º 1/c) é, simultaneamente, um direito dos trabalhadores e uma imposição constitucional dirigida aos poderes públicos (e aos empregadores), no sentido de estes fixarem os pressupostos e assegurarem o controlo das condições de higiene, segurança e saúde. Neste senti- do, compete ao Estado editar regulamentos de segurança, higiene e saúde e tomar efectivas medidas de controlo da aplicação destes regulamentos. Muitos dos aspectos relacionados com a higiene e segurança estão regulamentados em convenções internacionais da OIT que vinculam o Estado Português. Note-se que a LC n.º 1/97 introduziu a indispensabilidade de a prestação de trabalho ocorrer com condições de saúde, para além das condições de higiene e segurança. Procura-se dar abertura constitucional a algumas directivas laborais europeias referentes à segurança e saúde, hoje transpostas em larga medida para o plano interno (cfr. L 35/2004, arts. 2.º, 41.º e ss).» Finalmente, continuam os mesmos autores, na pág. 775, quanto ao n.º 2 do art. 59.º da Constituição: «Enquanto o n.º 1 deste artigo reconhece direitos imediatamente dirigidos contra as entidades empregadoras e o Estado, o n.º 2 estabelece um conjunto de tarefas (incumbências) dirigidas ao Estado (desde logo ao legislador), no sentido de realizar os primeiros (cfr. o caput do n.º 2). Trata-se, portanto, de direitos positivos dos trabalhadores, aos quais correspondem obrigações de concretização (através de leis e outras medidas) do Estado (e não dos em- pregadores), sob pena de inconstitucionalidade por omissão e, eventualmente, de responsabilidade civil do Estado pelos danos causados por essa omissão (cfr. art. 22.º).» Finalmente, há a recordar que a Lei 35/2004, ao estabelecer um sistema de controlo de saúde dos trabalha- dores, com o objectivo de verificar a sua aptidão física e psíquica para o exercício da actividade laboral, limitou-se a cumprir as obrigações impostas pela Directiva 89/391/CEE, do Conselho, de 12 de Junho. A qual, note-se, no respectivo art. 14.º n.º 1, impôs a necessidade de serem tomadas medidas destinadas a assegurar a vigilância adequada da saúde dos trabalhadores em função dos riscos para a sua segurança e saúde no local de trabalho, mais exigindo o art. 4.º n.º 2 que os Estados-Membros adoptassem um controlo e uma fiscalização adequadas ao cum- primento das disposições constantes dessa Directiva. Logo, quando o Estado impôs a necessidade de serem realizados controlos eficazes da saúde dos trabalhadores e da sua aptidão para o exercício das suas tarefas profissionais, e estabeleceu um regime sancionatório, fê-lo não só porque havia que cumprir aquela Directiva 89/391/CEE, mas ainda porque o art. 59.º n.º 1 al. c) e n.º 2 da
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