TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
139 ACÓRDÃO N.º 187/10 c ) Exames ocasionais, sempre que haja alterações substanciais nos componentes materiais de trabalho que possam ter repercussão nociva na saúde do trabalhador, bem como no caso de regresso ao trabalho depois de uma ausência superior a 30 dias por motivo de doença ou acidente. 3 – Para completar a observação e formular uma opinião precisa sobre o estado de saúde do trabalhador, o médico do trabalho pode solicitar exames complementares ou pareceres médicos especializados. 4 – O médico do trabalho, face ao estado de saúde do trabalhador e aos resultados da prevenção dos riscos pro- fissionais na empresa, pode reduzir ou aumentar a periodicidade dos exames, devendo, contudo, realizá-los dentro do período em que está estabelecida a obrigatoriedade de novo exame. 5 – O médico do trabalho deve ter em consideração o resultado de exames a que o trabalhador tenha sido submetido e que mantenham actualidade, devendo instituir-se a cooperação necessária com o médico assistente.» A violação destes deveres constituía contra-ordenação grave (artigo 484.º, n.º 2, da mesma Lei). Esta qualificação foi “acidentalmente” revogada, deixando a infracção sem sanção repressiva. Considera a sentença recorrida que, nesta medida, o legislador, porventura contra o seu próprio plano, mas de modo que é insu- perável por via interpretativa ou integrativa, criou uma situação de deficit de protecção constitucionalmente intolerável, porque o sistema regrediu relativamente ao grau de consagração anteriormente vigente. Colocam-se, por esta via, dois problemas que, nos limites do “caso” submetido, importa considerar. O de saber se (e em que medida) a Constituição consagra em matéria de direitos sociais o chamado princípio da proibição do retrocesso social e se, neste domínio, existem deveres constitucionais de configuração de determinadas condutas como ilícito de mera ordenação social. 7. Deve começar por notar-se que a norma em causa não tem por efeito diminuir o âmbito dos deveres do empregador no que se refere à protecção da saúde do trabalhador. A protecção prescrita, os deveres da entidade patronal, não sofreu modificações. O que da norma em causa resulta é o enfraquecimento do nível prático de efectividade mediante a supressão da tutela sancionatória ou repressiva. Isto compromete a viabili- dade ou, pelo menos, o interesse de consideração do problema à luz do princípio da proibição do retrocesso social de modo autónomo relativamente ao segundo aspecto da questão, que é o de saber se existe dever de tutela pela via sancionatória do ilícito de mera ordenação social . Pelo que os dois aspectos serão objecto de apreciação conjunta. Ou seja, a questão que o tribunal tem para responder consiste em saber se o legislador pode, relativamente à violação de direitos fundamentais dos trabalhadores a que, em momento anterior, a ordem jurídica conferira o reforço de tutela da sanção contra-ordenacional, descaracterizar a respectiva vio- lação como ilícito de mera ordenação social. Acerca do referido princípio afirmou-se no Acórdão n.º 509/02, in Diário da República , I Série-A, de 12 de Fevereiro de 2003 (substituição do rendimento mínimo garantido pelo rendimento social de inserção), o seguinte: « 9. Embora com importantes e significativos matizes, pode-se afirmar que a generalidade da doutrina converge na necessidade de harmonizar a estabilidade da concretização legislativa já alcançada no domínio dos direitos sociais com a liberdade de conformação do legislador. E essa harmonização implica que se distingam as situações. Aí, por exemplo, onde a Constituição contenha uma ordem de legislar, suficientemente precisa e concreta, de tal sorte que seja possível «determinar, com segurança, quais as medidas jurídicas necessárias para lhe conferir exe quibilidade» (cfr. Acórdão n.º 474/02, ainda inédito), a margem de liberdade do legislador para retroceder no grau de protecção já atingido é necessariamente mínima, já que só o poderá fazer na estrita medida em que a alteração legislativa pretendida não venha a consequenciar uma inconstitucionalidade por omissão – e terá sido essa a situa- ção que se entendeu verdadeiramente ocorrer no caso tratado no já referido Acórdão n.º 39/84. Noutras circunstâncias, porém, a proibição do retrocesso social apenas pode funcionar em casos-limite, uma vez que, desde logo, o princípio da alternância democrática, sob pena de se lhe reconhecer uma subsistência mera- mente formal, inculca a revisibilidade das opções político-legislativas, ainda quando estas assumam o carácter de opções legislativas fundamentais.
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