TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
157 ACÓRDÃO N.º 195/10 Não pode, por isso, transpor-se para o presente caso, sem mais, o juízo de inconstitucionalidade formu- lado no Acórdão n.º 596/03, na medida em que este se pronunciou sobre o terceiro segmento da norma em questão (“devolução de questão prejudicial para juízo não penal”). Neste Acórdão n.º 596/03, entendeu-se, em síntese, que a interpretação segundo a qual aquele terceiro segmento da norma (“devolução de questão prejudicial para juízo não penal”) compreende o recurso de fisca lização concreta interposto para o Tribunal Constitucional, em processo crime, é inconstitucional, por violação do artigo 280.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), na medida em que esta norma constitucional prevê com clareza, em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade de normas, a existência de um re- curso para o Tribunal Constitucional e não de uma espécie de mecanismo de reenvio a título prejudicial para este Tribunal, para resolução de questões de constitucionalidade que surjam na pendência de processos judiciais. Também no sentido de que o “processo de fiscalização abstracta sucessiva” pendente no Tribunal Cons- titucional não constitui uma “acção” na qual se controverte “questão prejudicial própria” já se tinha pro- nunciado o Acórdão n.º 200/98 (que julgou inconstitucional a norma contida no artigo 3.º do Código de Processo Penal de 1929, quando interpretada no sentido dessa qualificação). A diferença apontada foi salientada no Acórdão n.º 529/08, onde se decidiu não tomar conhecimento do objecto de recurso, interposto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Consti- tucional, por se ter entendido não haver coincidência entre a norma julgada inconstitucional pelo já citado Acórdão n.º 596/03 (invocado como acórdão-fundamento) e o acórdão aí recorrido, que fundamentava a decisão sobre a suspensão do prazo de prescrição, não no terceiro segmento da norma em questão mas, tal como no presente recurso, no segundo segmento da mesma norma. Em suma, nos presentes autos a questão colocada não é a da qualificação do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade como uma “questão prejudicial” (questão apreciada no referido Acórdão n.º 596/03), mas sim a «qualificação do Tribunal Constitucional como “tribunal não penal”», para efeitos do segundo segmento da norma questionada, ou seja, «para efeitos de suspensão do prazo de prescrição por o procedimento criminal “não poder legalmente iniciar-se ou continuar” por estar pendente de “sentença a proferir por tribunal não penal”». 9. Como é sabido, não cabe ao Tribunal Constitucional interpretar o direito ordinário ou sindicar a bondade da interpretação feita pelas instâncias, no plano do direito infraconstitucional. A interpretação sufragada no acórdão recorrido – segundo a qual a «pendência de recurso para o Tri- bunal Constitucional» constitui uma causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento criminal prevista no segmento normativo “falta de sentença a proferir por tribunal não penal” – constitui um dado adquirido, no âmbito do presente recurso, cabendo apenas ao Tribunal Constitucional confrontar tal inter- pretação com as normas e princípios constitucionais aplicáveis. Assim, no presente recurso cabe apenas averiguar a constitucionalidade da qualificação do Tribunal Constitucional como “tribunal não penal” para efeito de se suspender o prazo de prescrição durante a pendência de um recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, interposto em processo crime. 10. Os parâmetros constitucionais convocados nas alegações dos recorrentes, são os seguintes: (i) violação do artigo 280.º da CRP, na medida em que contraria a natureza do recurso de constitucio- nalidade, como verdadeiro recurso, configurando-o como mero incidente de devolução de questão prejudicial ao Tribunal Constitucional, sendo esta configuração como “questão prejudicial” con- ceptualmente incompatível com a ideia de “recurso” prevista nesta norma constitucional (invocada pelo Ministério Público e pelo recorrente particular); (ii) violação do artigo 20.º, n. os 4 e 5, da CRP, na medida em que prolonga injustificadamente a dura- ção do processo penal (recorrente particular); (iii) violação do princípio da proporcionalidade e das garantias de defesa, na medida em que amplia os prazos de prescrição do procedimento criminal sem qualquer limite temporal (Ministério Público);
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