TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
165 ACÓRDÃO N.º 195/10 dos elementos complexos da norma, e da subsunção a esse parâmetro da norma concretamente aplicada, mas da determinação do sentido da norma infraconstitucional. De qualquer jeito, não podemos deixar de considerar que a dimensão normativa do artigo 119.º, n.º 1, alínea a) , do Código Penal, nos termos da qual, segundo o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, a decisão do Tribunal Constitucional, proferida em recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade interposto no processo penal e para conhecimento de norma nele aplicada como ratio decidendi da decisão penal, é uma decisão proferida por tribunal não penal viola o artigo 280.º da Constituição. Quanto intervém na decisão dos recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade de normas aplicadas por outros tribunais, nos termos do artigo 280.º da CRP, o Tribunal Constitucional está a adminis trar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional (artigo 221.º da Constituição). Mas essa justiça é feita sobre a norma que regula a situação jurídica concreta e por aplicação da qual o tribunal recorrido ditou a decisão do caso. E mais, sobre norma de direito infraconstitucional cuja questão de validade constitucional o tribunal recorrido não podia deixar de pronunciar-se, se suscitada por alguma das pessoas com legitimidade para a causa (artigo 204.º da CRP), segundo o sistema de controlo difuso da constitucionalidade adoptado pela nossa Lei fundamental (cfr. José Manuel M. Cardoso da Costa, A Jurisdição Constitucional em Portugal , 3.ª edição, pp. 42 e segs.). Quer isto dizer que a questão de constitucionalidade, sob o ponto de vista da relação jurídico-material a que respeita a norma constitucionalmente sindicada e que foi aplicada para a decisão do caso, transporta essa mesma natureza. Daí que o recurso de constitucionalidade seja meramente instrumental: ele é um instrumento através do qual se resolve definitivamente a questão da validade da norma que foi aplicada pelo tribunal recorrido para proferir a decisão que proferiu. OTribunal Constitucional limita-se a reexaminar o juízo feito, ou que devia ter sido feito, pelo tribunal recorrido sobre a validade constitucional dessa norma, como pressuposto para poder depois elaborar o juízo subsuntivo-decisório do caso. Assim sendo, a decisão do Tribunal Constitucional comunga da natureza própria da norma de direito constitucional que sindica: civil, penal, processo-penal, administrativo, fiscal, etc. Nesta perspectiva, o Tribunal Constitucional é um tribunal penal, administrativo, cível, etc. e não, como ajuizou o acórdão recorrido, um tribunal não penal. A natureza da concreta relação jurídica a que respeita a norma constitucionalmente sindicada continua a manter-se presente. Por outro lado, o recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade está constitucionalmente conformado de modo a casar-se harmoniosamente com os recursos previstos em cada um dos regimes de pro- cesso a que respeitam as normas constitucionalmente impugnadas, podendo falar-se de um sistema harmo nizado e sincronizado dos recursos. Expressão máxima dessa simbiose é a interrupção dos prazos de interposição de outros recursos, se interposto recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, prevista no artigo 75.º da Lei do Tribunal Constitucional: o recurso para o Tribunal Constitucional está previsto como meio processual de se resolver de vez a questão de constitucionalidade da norma de direito infraconstitucional. Assim sendo, a interpretação adoptada pelo acórdão recorrido viola este figurino do recurso constitucional previsto no artigo 280.º da Constituição, tendo a decisão do mesmo sobre matéria jurídico-constitucional de norma de direito penal ou processo penal ou outra, também, a natureza dessa norma. – Benjamim Rodrigues. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República, II Série, de 16 de Junho de 2010. 2 – Os Acórdãos n. os 1166/96, 200/98 e 183/08 estão publicados em Acórdãos, 35.º, 39.º e 71.º Vols., respectivamente. 3 – Os Acórdãos n. os 412/03 e 596/03 estão publicados em Acórdãos , 57.º Vol.
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