TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
203 ACÓRDÃO N.º 207/10 33. Trata-se, ademais, de consagrar a imparcialidade dos tribunais não apenas como um princípio geral de organização judiciária e de disciplina processual, mas também –, e sobretudo – como um direito fundamental dos cidadãos. 34. Como a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem há muito vem definindo, há dois testes para aferir se um tribunal é imparcial, nos termos e para os efeitos do art. 6.°, § 1, da CEDH: o primeiro consiste em determinar a convicção pessoal de juiz num caso particular (critério subjectivo) e o segundo consiste em apurar se o juiz oferecia garantias suficientes de modo a excluir qualquer dúvida legítima acerca da mera aparência de imparcialidade (assim, entre tantos outros arestos, cfr. Ac. Saraiva de Carvalho v. Portugal, 22 Abril de 1994, § 33; ac. Kyprianou v. Cyprus [GC], N.º 73797/01, § 118; Ac. Brudnicka and Others v. Poland, N.º 54723/00, § 41). 35. No quadro do teste subjectivo, a jurisprudência do TEDH tem concluído inequivocamente pela falta de imparcialidade naqueles casos em que, mesmo sem ser levantada qualquer dúvida acerca da sua conduta pessoal, um juiz tem intervenção no mesmo processo no exercício de diferentes funções judiciárias (Ac. Piersack v. Belgium, 1 de Outubro de 1982, N.° 8692/79, § 31). 36. No quadro do teste objectivo, importa determinar se existem factos demonstráveis que excluam qualquer dúvida legítima acerca da imparcialidade do juiz, de modo que o valor da confiança nos tribunais, fundamental para uma sociedade democrática, não seja colocado em causa. Esta dúvida deve ser aferida de acordo com um cri tério objectivo (assim, Ac. Pullar v. the United Kingdom, 10 Junho 1996, § 37; Ac. Ekeberg and Others, Ekeberg and Others v. Norway, 31 Julho 2007, n. os 11106/04, 11108/04, 11116/04, 11311/04 and 13276/04, § 31). 37. Ora, seja de acordo com um teste objectivo, seja de acordo com um teste subjectivo, resulta evidente que o Conselheiro Cadilha não oferecia garantias de imparcialidade para poder intervir no julgamento do recurso de constitucionalidade. 38. Note-se que não está em causa a conduta pessoal ou a dignidade profissional daquele magistrado. 39. Está, isso sim, em causa a circunstância de que o Conselheiro Cadilha não poderia ter tido intervenção nos autos por se verificarem relativamente a ele factos objectivos que colocavam em causa, seja de um ponto de vista objectivo, seja de um ponto de vista subjectivo, a sua imparcialidade para intervir no julgamento do recurso. 40. Ora, tendo em consideração a jurisprudência do TEDH – instituição à qual a recorrente não hesitará em recorrer –, seria de uma sinistra ironia que o Estado Português viesse a ser condenado por uma violação do direito fundamental a um processo justo e equitativo cometida pelo tribunal que em Portugal tem por missão, precisa mente, servir de primeiro garante dos direitos fundamentais dos cidadãos. 41. Em suma, está-se perante uma nulidade processual. 42. A consequência da prática dessa nulidade é a anulação do douto Acórdão do Tribunal Constitucional – art. 201.º, n.º 2, do CPC. 43. Com efeito, constatada a influência da prática do acto proibido por leu na decisão da causa, “…os efeitos da invalidade do acto repercutem-se nos actos subsequentes da sequência processual que dele forem absolutamente dependentes (art. 201-2). Sempre, por isso, que um acto da sequência pressuponha a prática dum acto anterior, a invalidade deste tem como efeito, indirecto mas necessário, a invalidade do acto subsequente que porventura entretanto tenha sido praticado (e, por sua vez, dos que, segundo a mesma linha lógica, se lhe sigam”– cfr., José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, 1996, pgs. 19 e 20. 44. Por outro lado, a nulidade é arguida em tempo. 45. Até à prolação do Acórdão do Tribunal Constitucional, a requerente ignorava, sem culpa, que se verificava uma causa de impedimento do Senhor Conselheiro Cadilha. 46. Sendo certo que nada indiciava nos autos que esse ilustre Juiz Conselheiro fizesse parte da secção a que fora distribuído o recurso de constitucionalidade. 47. Por um lado, a requerente não foi notificada da distribuição. 48. Por outro lado, após a interposição do recurso e até ao julgamento do mesmo, houve uma única notifi cação, datada de 25 de Novembro de 2008, a qual dá conhecimento do teor do despacho proferido pelo então Juiz-Relator, Conselheiro Vítor Gomes, e fixa o prazo de 30 dias para alegações.
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