TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
218 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL por razões de ordem financeira, nomeadamente na área socialmente mais premente da justiça criminal. Nas demais situações, designadamente naquelas em que se discutam interesses patrimoniais e de natureza económica, entendeu-se dever ser aceite que uma parte dos custos da justiça seja suportada por quem a ela recorre e dela retira benefícios, e não pela generalidade dos cidadãos, reconhecendo-se que o sistema não acautelava este objectivo, antes beneficiava quem recorre indiscriminadamente e de forma imponderada aos tribunais e quem dá causa à acção, impondo ao Estado (e à comunidade) o ónus de suportarem grande parte dos custos da justiça. Por outro lado, o legislador pretendeu consagrar o princípio de que, salvo ponderosas excepções, todos os sujeitos processuais, independentemente da sua natureza ou qualificação jurídica, deviam estar sujeitos ao pagamento de custas, desde que tenham capacidade económica e financeira, sendo as excepções equa cionadas em sede de apoio judiciário. Tal medida visou ainda concretizar plenamente o direito de acesso ao direito e aos tribunais, sob a garantia da efectiva igualdade processual entre a administração e os cidadãos, constituindo factor de responsabilização acrescida do Estado e demais entidades públicas pelas consequências derivadas das suas actuações e do seu comportamento processual, moralizando e racionalizando o recurso aos tribunais. Através do Decreto-Lei n.º 324/2003, o legislador revogou ainda todas as normas contidas em legislação avulsa que estabeleciam isenções de custas a favor do Estado e outras entidades públicas, beneficiando de algumas diferenças quanto à dispensa de pagamento de taxa de justiça inicial e subsequente e no prazo de pagamento. 10. É certo que o Tribunal Constitucional, mais tarde, com a prolação do Acórdão n.º 106/04 ( Diário da República, II Série, de 24 de Março de 2004), julgou, por maioria, inconstitucional, por violação do arti go 20.º, n.º 1, parte final, e n.º 2, da Constituição, a norma ínsita no n.º 5 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, na redacção introduzida pela Lei n.º 46/96, de 3 de Setembro, na inter pretação segundo a qual veda a concessão de patrocínio judiciário gratuito às sociedades, ainda que provem que os seus custos são consideravelmente superiores às suas possibilidades económicas e que se tratam de acções alheias à sua actividade económica normal (e também assim no Acórdão n.º 560/04). Mas se atentarmos nesse caso concreto veremos que, no primeiro caso, a requerente do apoio judiciário era uma sociedade comercial em liquidação por motivo de falência, e que, em ambos os casos, o pleito era alheio à actividade económica normal da sociedade. A posição que fez vencimento por maioria retoma um voto de vencido aposto no Acórdão n.º 97/99 e refere: «Contemplando o sistema de acesso ao direito e aos tribunais, distinguem-se duas vertentes, de informação jurí dica e protecção jurídica, das quais a segunda reveste duas modalidades – consulta jurídica e apoio judiciário (artigo 6.º do referido Decreto-Lei n.º 387-B/87). Existem, por sua vez, duas formas de apoio judiciário: dispensa de despesas judiciais e pagamento dos serviços do advogado ou solicitador (artigo 15.º, n.º 1, do citado diploma). Os beneficiários do direito à protecção jurídica estão enumerados no referido artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 387-B/87, resultando, na interpretação do n.º 5, em questão, que as sociedades – civis ou comerciais –, bem como os comerciantes em nome individual nas causas relativas ao exercício do comércio e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limi tada, não têm direito a patrocínio judiciário gratuito, mas apenas ‘à dispensa, total ou parcial, de preparos e do paga mento de custas ou ao seu diferimento’, e se demonstrarem que o respectivo montante é ‘consideravelmente superior às [suas] possibilidades económicas’, ‘aferidas designadamente em função do volume de negócios, do valor do capital ou do património e do número de trabalhadores ao seu serviço’. Como se vê, esta limitação não só não inclui todas as pessoas colectivas como não é sequer específica de pes soas colectivas. Aplica-se, igualmente, a pessoas singulares, e, mesmo, a entes não personalizados, como são os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada. Assim, a questão de constitucionalidade não se põe no confronto com o artigo 12.º, n.º 2, da Constituição. A norma em questão funda-se, antes, na circunstância,
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