TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

22 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III — Decisão Face ao exposto, o Tribunal Constitucional decide não declarar, com força obrigatória geral, a incons- titucionalidade da norma contida no artigo 10.º, n.º 4, da Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto, quando aplicada às mensagens de propaganda. Lisboa, 2 de Junho de 2010. – Maria João Antunes – Carlos Pamplona de Oliveira – Joaquim de Sousa Ribeiro – Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Gil Galvão – Maria Lúcia Amaral (com declaração que segue em anexo) – Benjamim Rodrigues (com a declaração de que incluo no conceito dos meios de comunica- ção social todo o meio de expressão do pensamento, normativamente regulado, numa acepção, porém, mais ampla do que a actualmente qualificada como tal na lei infraconstitucional) – João Cura Mariano (vencido pelas razões constantes da declaração que junto) – José Borges Soeiro (vencido, de harmonia com a declaração de voto que junto) – Carlos Fernandes Cadilha (vencido pelas razões constantes da declaração de voto do Conselheiro Cura Mariano) – Rui Manuel Moura Ramos (vencido, pelo essencial das razões constantes das declarações de voto dos Senhores Conselheiros Cura Mariano e Borges Soeiro). DECLARAÇÃO DE VOTO É minha convicção firme que uma Constituição não pode ser interpretada como se fora um agregado de preceitos e de segmentos de preceitos, susceptíveis de serem isolados ad infinitum e susceptíveis de serem portadores, cada um deles, de um sentido prescritivo auto-suficiente que possa ser imputado à norma consti- tucional. Esta é uma leitura que, a meu ver, desconhecendo a estrutura particular das normas constitucionais e desconsiderando a unidade sistemática da Constituição, pode conduzir a resultados interpretativos inidóneos. No caso, não considero que tenha sido inidóneo o resultado final a que conduziu o método interpre- tativo adoptado. Formulou-se um juízo de não inconstitucionalidade que, por inteiro, compartilho. Mas o que não posso acompanhar é o caminho que se seguiu para a formulação do juízo: a determinação do sentido do último inciso do n.º 3 do artigo 37.º da Constituição tendo em conta o disposto no seu artigo 39.º, de modo a restringir, no caso, o conceito constitucional de liberdade de expressão às mensagens de propaganda difundidas, apenas, pelos meios de comunicação social. Não me parece que seja este o método adequado para resolver o problema que fora colocado ao Tribunal. Pela especial natureza dos bens jurídicos que protege, a norma do artigo 37.º da Constituição deve ser vista, quanto ao âmbito de comportamentos a incluir na sua fattispecie , como uma norma de largo espectro. Na sua dimensão objectiva e institucional, a liberdade de expressão exerce uma função estruturante do siste- ma de direitos fundamentais e da arquitectura principial do Estado democrático. Por causa dessa sua função, não é legítimo que o Tribunal a entenda através dos apertados critérios que são defendidos pelas chamadas teorias do âmbito restrito de protecção das normas que consagram direitos. Tais teorias tendem a excluir a priori , e em termos gerais e abstractos, certos comportamentos do âmbito de protecção das normas consti- tucionais, sempre que esses comportamentos correspondam ao cumprimento de deveres que sejam decor- rentes, ou de direitos dos outros, ou, simplesmente, da consagração objectiva de outros princípios constitu- cionais. Não está agora em discussão a questão de saber se tais teorias (as do âmbito restrito de protecção) devem ou não ser sempre afastadas, qualquer que seja o direito fundamental a que se reportem. Certo é que, no caso da liberdade de expressão, tudo, no sistema constitucional, parece recomendar o seu afastamento. É por isso que o Tribunal tem sempre dito, e com muita razão, que “a propaganda, nomeadamente, que não apenas, a propaganda política”, é uma forma de expressão do pensamento que está abrangida pelo âmbito de protecção da liberdade de expressão.

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