TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

222 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de promoção pelo Estado de acesso à justiça, atenta a ressalva quanto às pessoas colectivas em geral prevista no artigo 12.º, n.º 2, da Constituição. O direito de acesso aos tribunais como direito fundamental, radica essencialmente na dignidade huma­ na como princípio estruturante da República (artigo 1.º da Constituição), reconhecido no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e igualmente acolhido no artigo 6.º da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais. Não são comparáveis as situações de concessão de apoio a pessoas singulares e a pessoas colectivas, pelo que a promoção das condições positivas de acesso aos tribunais nos casos de insuficiência económica não tem o mesmo significado quanto a pessoas singulares e quanto a pessoas colectivas com fim lucrativo, que devem, por imposição legal, integrar na sua actividade económica os custos com a litigância judiciária que desenvolvem, assim assegurando a protecção dos interesses patrimoniais da universalidade dos credores e do próprio interesse geral no desenvolvimento saudável da economia. Já quanto ao cidadão comum, bem se deve reconhecer que tais custos representam, em regra, uma despesa excepcional e episódica. Para além do mais, a norma em causa não inviabiliza totalmente o direito de acesso à justiça, já que as pes­ soas colectivas que se encontram em situação verdadeiramente deficitária, beneficiam de isenção de custas em qualquer processo (excepto de foro laboral, como já se assinalou), não carecendo, por isso, de qualquer apoio. Acresce que é permitido que os custos derivados de contencioso sejam deduzidos aos rendimentos das pessoas colectivas pelo que, apesar de serem suportados inicialmente, acabam por ser abatidos para efeitos de determinação da matéria colectável, ou mesmo quando a acção é alheia à actividade económica da empresa: os seguros deverão ser efectuados para prevenir situações de responsabilidade civil, sendo certo que são também considerados custos, dedutíveis à matéria colectável (e que nem podem ser considerados custos os prejuízos que advenham de situações que seriam seguráveis). Por outro lado, não pode de modo algum esquecer-se que a protecção jurídica de pessoas colectivas com fim lucrativo corresponderia a uma opção de proteger a litigância de sociedades comerciais sem condições de assegurar a sua actividade económica, o que se mostra desconforme com a injunção constitucional prevista no artigo 81.º, alínea f ), de assegurar o funcionamento dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, e a sua competitividade, o que implica aceitar que aquelas que se mostram incapazes de suportar os custos normais da sua actividade económica, tornando-se inviáveis, não devem prosseguir a sua actividade. Não faz sentido, com efeito, que a existência das pessoas colectivas com fins lucrativos implique a absor­ ção de proveitos económicos gerados globalmente pela comunidade. Caso contrário, o legislador coloca a cargo dos contribuintes uma parte dos custos da actividade das pessoas jurídicas que têm como fim obter lucros, o que dificilmente é sustentável. Não podemos esquecer que, para o caso específico das sociedades, a lei procura evitar que ocorra a situação de insuficiência ao prever a constituição de reservas de capital impondo medidas quando tal situação deficitária venha, ainda assim, a ter lugar. Pretende-se, em suma, que as empresas em actividade tenham um mínimo de sustentação financeira. Por último, a norma em apreciação não constitui uma restrição desproporcional e injustificada do direi­ to à efectivação do acesso à justiça. Mesmo que se entenda que a diferenciação não pode ser total ou que será necessário respeitar uma certa proporcionalidade relativamente às demais situações, tem de se reconhecer que tal diferenciação é justificada pela diversidade de condições atrás referidas e está sustentada por razões de interesse público, não sendo arbitráriaa opção legislativa. E não deve esquecer-se que, tal como o Tribunal tem sempre aceitado, o legislador goza de uma certa margem de liberdade conformadora na concretização prática do conceito de insuficiência económica para efeito do apoio judiciário, realidade com contornos imprecisos que inevitavel­ mente se liga não só aos encargos concretos da lide a cargo do interessado, mas, essencialmente, à situação económica deste. Ora, a relatividade do conceito de insuficiência económica autoriza, para este efeito, que a

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