TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
266 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Essa liberdade científica ou de “cátedra”, ínsita no sentido da autonomia científica e pedagógica, reconhecida constitucionalmente às universidades, postula, de um lado, que o acesso à docência e à investigação universitária e a progressão na carreira sejam feitas, apenas, segundo o critério do mérito e da capacidade científica e pedagó gica universitárias, e, do outro, que no processo dessa avaliação, os docentes universitários, enquanto agentes dessa liberdade científica, tenham necessariamente de intervir. A liberdade científica, pressuposta pela autonomia científica das universidades, não pode deixar, assim, de excluir tanto as intervenções “vindas de fora” que tenham como efeito a limitação no exercício dessa liberdade científica, como as próprias intervenções “vindas de dentro susceptíveis de produzir idêntica limitação” (Tomás Ramón Fernández, ob. cit. , p. 52).» A importância das referidas funções crítica e formativa das Universidades no desenvolvimento das socie dades encontra-se suficientemente plasmada no artigo 11.º, n.º 3, da Lei de Bases do Sistema Educativo – aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, na redacção resultante da Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto – que dispõe que « o ensino universitário, orientado por uma constante perspectiva de promoção de investigação e de criação do saber, visa assegurar uma sólida preparação científica e cultural e proporcionar uma formação técnica que habilite para o exercício de actividades profissionais e culturais e fomente o desen volvimento das capacidades de concepção, de inovação e de análise crítica». Assim, com interesse para o caso sob análise, importa concluir que, em princípio, haverá inconstitu cionalidade material por violação da autonomia universitária, isto é da liberdade de cátedra, se o legislador ordináriodeterminar que o corpo docente universitário não é seleccionado pela própria comunidade cien tífica segundo os critérios do mérito e da capacidade científica e pedagógica por aquela definidos. 2.6. Confronto da interpretação normativa sob fiscalização com o princípio da autonomia universitária Como já se viu atrás, a regra constitucional do concurso prescrita para a Administração Pública foi tam bém adoptada pelo ECDU em matéria de recrutamento de professores catedráticos. Contudo, o tribunal a quo entendeu, face à legislação aplicável ao concurso em causa, que as garantias do concurso público previstas no artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 204/98, têm de ser igualmente res peitadas nos concursos de provimento de professores catedráticos. A justiça constitucional portuguesa já se pronunciou positivamente sobre a incidência do direito funda mental de acesso aos cargos públicos em matéria de progressão na carreira docente universitária. No citado Acórdão n.º 491/08, o Tribunal Constitucional entendeu nomeadamente, com relevância para o caso sob análise: «[...] 8.5. (...) O direito fundamental de acesso aos cargos públicos em condições de igualdade e de liberdade, consagrado no n.º 2 do artigo 47.º da Constituição, vale, por inteiro, também, no acesso à docência e nos concursos previstos para a progressão na carreira universitária. Ora, não pode esquecer-se que o Tribunal Constitucional tem, a respeito do artigo 47.º da Constituição, uma vasta jurisprudência onde afirma que o acesso à função pública (e a progressão na mesma) compreende o direito de nenhum cidadão ser excluído da possibilidade de acesso, seja à função pública em geral, seja a uma determinada função em particular, por outro motivo que não seja a falta dos requisitos adequados à função ( v. g. idade, habilitações académicas e profissionais); o respeito pela igualdade e liberdade, não podendo haver discriminação nem diferenciações de tratamento baseadas em factores irrelevantes, nem, por outro lado, regi mes de constrição atentatórios da liberdade e, por fim, a obrigatoriedade da adopção da regra do concurso como forma normal de provimento de lugares, desde logo de ingresso, devendo ser devidamente justificados os casos
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