TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
296 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I — Relatório 1. Na sequência de agravo interposto de despacho proferido no 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Guimarães, que indeferiu a penhora de salário ao executado no processo de execução para pagamento de quantia certa que a exequente A. Lda., move ao executado B., a Relação de Guimarães manteve o despacho recorrido, e «recusou» a aplicação da norma do artigo 824.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, do Código de Processo Civil, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de Setembro, «com o sentido de permitir a penhora de vencimento quando o respectivo valor é igual ao salário mínimo nacional, dispensando a prova de insuficiência económica por parte do executado, por violação do princípio da dignidade humana, contido no princípio do Estado de direito, resultante da disposição conjugada do artigo 59.º, n.º 1, alínea a), e 2, alínea a), da Constituição» . Disse a Relação: «(…) No caso dos autos a questão a decidir respeita à viabilidade da penhora de parte de salário cujo valor é igual ao salário mínimo nacional. A execução iniciou-se em 2003 pelo que o regime aplicável é o introduzindo pelo DL n.º 180/96 de 25.09, uma vez que o actual regime, introduzido pelo DL n.º 38/2003 de 08.03 só se aplica a processos instaurados a partir de 15.09.2003 – art. 2l.º do DL n.º 38/2003. A penhora de vencimentos está prevista no art. 824.º que na redacção anterior à reforma de 2003 estipulava (no que interessa à decisão deste litígio) que não podiam ser penhorados dois terços do vencimento ou salários auferidos pelo executado. O juiz fixava a penhora entre 1/3 e 1/6 podendo eventualmente isentar os rendimentos de penhora tendo em conta a natureza da dívida e as necessidades do executado e respectivo agregado familiar. O salário mínimo nacional para o ano de 2007 foi fixado em 403 € – DL n.º 02/2007 de 03.01. O despacho impugnado indeferiu a pretensão de penhora da agravante com fundamento da inconstituciona lidade do art. 824.º quando interpretado no sentido de ser possível a penhora de vencimento quando o respectivo valor é igual ao salário mínimo. Argumenta a agravante com a constitucionalidade do preceito invocando o Ac. do TC de 16.02.2007. Efectivamente neste acórdão decidiu-se pela constitucionalidade do art. 824.º do CPC quando interpretado no sen tido de permitir a penhora do vencimento do executado mesmo quando o valor deste seja o do salário mínimo nacional. O fundamento assenta na diferenciação que o legislador faz quanto à natureza de salários e pensões e na pos sibilidade de uma eventual isenção decretada pelo Juiz. Efectivamente o Ac. de 2002 respeita a pensões e o de 2006 respeita a salários. No Ac. de 2002 estipulou-se que é inconstitucional a norma que resulta da conjugação do disposto no art. 824.º n.º 2 e n.º 1 al. b) do CPC na parte em que permita a penhora até um terço das prestações periódicas pagas ao executado que não é titular de outros bens penhoráveis suficientes para satisfazer a dívida exequenda, a título de regalia social ou de pensão, cujo valor global não seja superior ao salário mínimo nacional, por violação do princípio da dignidade humana contido no princípio do Estado de Direito, e que resulta das disposições conjuga das do art. 1.º, da al. a) do n.º 2 do art. 59.º e dos n.º 1 e 3 do art. 63.º da CRP. O Ac de 2006 tem dois votos de vencido e nestes votos os respectivos subscritores (Mário Torres e Maria FernandaPalma) defendem a aplicação da teoria de 2002 aos salários dizendo que “...o juízo de inconstitucionali dade visa afastar as normas jurídicas que se mostrem desconformes com normas ou princípios constitucionais, tal objectivo não sendo assegurado se permite a existência dessas normas com a mera esperança de que uma interven ção casuísticade um juiz mais sensível ou atento venha a evitar a produção do resultado tido como constitucio nalmente intolerável: a privação dos rendimentos estritamente necessários a uma vida minimamente condigna do executado e seu agregado familiar...”.
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