TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
338 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do ponto de vista patrimonial, deu azo a um regime de comunhão de bens (neste caso, conforme declarações nas escrituras referidas a fls. 59, 82, 88 e 92, de comunhão geral). Não estamos, pois, perante uma situação de voluntária entreajuda económica entre dois sujeitos titu lares apenas de patrimónios próprios, mas perante titulares de um património comum, uma massa de bens unitariamente detida, em comunhão, pelos dois cônjuges. É o próprio vínculo conjugal, com o regime de bens que lhe está, neste caso, associado, que cria obrigatoriamente uma situação de partilha de rendimentos e de comparticipação nos encargos contrária à representação estritamente individualista que a fundamentação da sentença recorrida exprime. Em configurações em que o agregado familiar é constituído por sujeitos unidos pelo casamento, em regime de comunhão geral, os rendimentos de cada um dos cônjuges não são isoláveis em esferas separadas, de titularidade individual, antes se constituem como componentes, desde o momento da sua aquisição, sem mais, de um património unitário, de titularidade comum. A imputação ao recorrente, para efeitos de avaliação da insuficiência económica justificativa de apoio judiciário, dos rendimentos do cônjuge-mulher surge, assim, como decorrência imediata e quase que diríamos forçosa do regime de bens do seu casamento. Acresce que, no caso sub judicio , é sobremodo patente a comunhão de interesses na acção que suscita o pedido de protecção jurídica. O requerente pretende propor uma acção de indemnização emergente de acidente de viação. Tudo indica que o veículo sinistrado é um bem comum. A obter ganho de causa, o montante da indemnização integrar-se-á no património comum. O que significa que, apesar de o pedido de apoio judiciário ter sido interposto apenas pelo recorrente, o evento lesivo também afectou directamente a integridade do património do seu cônjuge (a sua meação no bem lesado), património que será reposto pela acção de indemnização, em caso de vencimento. Por tudo, temos por incontroverso que a determinação do rendimento relevante para efeitos de con cessão de apoio judiciário a partir do rendimento do agregado familiar, composto pelo requerente e pelo cônjuge, casados em regime de comunhão geral, não viola o direito de acesso aos tribunais. 7.2. Importa agora ajuizar da outra questão de constitucionalidade suscitada nos autos, atinente à forma tabelar e rígida de cálculo dos montantes dos encargos do agregado familiar, que não permite a contabiliza ção, como tais, de despesas de saúde. A correlação causal entre uma coisa e outra é expressamente estabelecida na resposta que os serviços de Segurança Social deram à reclamação do requerente (fls. 162): «Quanto às despesas descritas, o simulador não as aceita, pois mediante os rendimentos, os activos patrimoniais e a dimensão do agregado familiar, efectua um cálculo da dedução de encargos com necessidades básicas e com a habitação por fórmulas matemáticas». O regime legal de dedução de encargos, para apuramento do rendimento relevante, é descrito no Acórdão n.º 126/08 do seguinte modo: «Concretizando um pouco mais os critérios legais aplicáveis à matéria em questão, importa observar que as despesas consideradas como elegíveis correspondem a duas categorias da classificação económica das despesas de consumo: a) Despesas pessoais básicas, que incluem as efectuadas com alimentação, vestuário e higiene. b) Despesas com a habitação. O volume destas despesas é calculado através da aplicação de coeficientes de dedução que variam em função do rendimento e que, no caso do coeficiente de dedução das despesas pessoais, variam também em função do número de elementos que constituem o agregado familiar. Os coeficientes de dedução das despesas são fixados em função da despesa média anual por agregado familiar e segundo os escalões de rendimento líquido do agregado familiar.
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