TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

344 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL também pode pôr em risco o próprio direito fundamental dos cidadãos de acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos (artigo 20.º, n.º 1, da CRP). Na verdade, quando as taxas de justiça atingem um montante de tal modo elevado que dificultem, de modo inexigível, a generalidade dos cidadãos de recorrer aos tribunais para defesa dos seus direitos, estamos perante inequívocas violações daquele direito constitucional. Como escrevem Jorge Miranda e Rui Medeiros: «A lei não pode (…) adoptar soluções de tal modo onerosas que na prática, impeçam o cidadão médio de aceder à justiça. Ou seja, salvaguardada a protecção jurídica para os mais carenciados, as custas não devem ser incomportáveis em face da capacidade contributiva do cidadão médio, não sendo constitucionalmente admissível a adopção de soluções em matéria de custas que, designadamente nos casos de maior incerteza sobre o resultado do processo, inibam os interessados de aceder à justiça (…). Concretamente, se é certo que nada impede que o montante das custas seja variável, a verdade é que o estabe­ lecimento de um sistema de custas cujo montante aumente directamente e sem limite na proporção do valor da acção coloca pelo menos, dois tipos de problemas. Por um lado, não está excluído que, rompida a proporcionalidade entre as custas cobradas e o serviço de admi­ nistração da justiça prestado, se deixe de estar perante verdadeiras taxas e se entre, pelo contrário, no domínio dos impostos. Por outro lado, no plano estritamente material, a solução em causa pode, na prática, consubstanciar-se na imposição de um sistema de custas excessivas inaceitável em face do artigo 20.º.” ( Constituição Portuguesa anotada , tomo I, p. 183, da edição de 2005, da Coimbra Editora). E Gomes Canotilho e Vital Moreira: «O reconhecimento do direito ao acesso ao direito e aos tribunais seria meramente teórico para muitas pessoas se não se garantisse que o direito à justiça não pode ser prejudicado por insuficiência de meios económicos (n.º 1, in fine ) … Incumbe à lei assegurar a concretização desta norma, não podendo, por exemplo, o regime das custas judiciais ser de tal modo gravoso que torne insuportável o acesso aos tribunais (…). A Constituição não determina a gratuitidade dos serviços de justiça, como sucede em termos tendenciais, com os serviços de saúde (artigo 64.º – 2/a) e o ensino básico universal (artigo 74.º – 2 /a). Mas o direito de acesso à justiça proíbe seguramente que eles sejam tão onerosos que dificultem, de forma considerável, o acesso aos tribu­ nais.» ( Constituição da República Portuguesa anotada , Volume I, da 4.ª edição, da Coimbra Editora). E a consagração de um sistema de apoio judiciário a quem tem uma situação económica insuficiente para fazer face aos custos duma acção, através da concessão de dispensa do pagamento total ou parcial das custas, não basta para garantir o acesso aos tribunais, quando o regime de custas permite a cobrança de valoresmuito elevados. Na verdade, quando estas atingem valores exagerados, não são só aqueles que não têm meios para os pagar que, se não forem dispensados de o fazer, se inibem de solicitar a intervenção do tribunal, mas também os que, apesar de disporem duma situação económica que lhes permite satisfazer tais montantes sem pôr em causa a sua sobrevivência condigna, igualmente se abstêm de recorrer ao tribunal, perante o risco de poderem ter de despender uma quantia exorbitante em custas. Assim se conclui que o sistema de fixação das taxas de justiça do CCJ, na redacção do Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, acima exposto, permitia a cobrança de taxas de justiça, cujo montante, exageradamente elevado, podia atentar contra os referidos parâmetros constitucionais da proibição do exces­ so e do direito de acesso aos tribunais. Apesar de não caber a este Tribunal aferir qual o concreto patamar em que se situa o limite em que a prestação pública se desliga dos custos da respectiva actividade ou em que o cidadão fica inibido de recorrer

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