TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
35 ACÓRDÃO N.º 256/10 7. O requerente fundamenta a ilegalidade dos artigos 4.º, n. os 1 e 2, e 5.º do Decreto Legislativo Regio nal n.º 1/2009/M na violação de uma das normas do EPARAM. Sucede que, se é consensualmente aceite que as leis estatutárias que contêm os estatutos político-administrativos das regiões autónomas possuem valor reforçado – o qual decorre da conjugação dos artigos 112.º, n.º 3, 280.º, n.º 2, alíneas b) e c) , e 281.º, n.º 1, alíneas c) e d) – também é verdade que se tem entendido que nem todas as normas estatutárias possuem esse valor reforçado e, nessa medida, servem de parâmetro para ajuizar da legalidade de outras normas legislativas. Isto mesmo já foi sublinhado por diversas vezes por este Tribunal, numa posição em que é acompanhado pela generalidade da doutrina. Assim, veja-se o que foi recentemente dito a este respeito no Acórdão n.º 525/08 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) : «Na verdade, a Constituição permite que certas leis apresentem um valor (absolutamente) reforçado quando, como é o caso, «devam ser respeitadas» pelas outras leis (artigo 112.º, n.º 3, da Constituição). A força vinculativa das suas normas determina a ilegalidade das normas inscritas em actos legislativos que as violem [alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 281.º da Constituição]. Os Estatutos das regiões autónomas são efectivamente leis especiais que a Constituição gradua entre as leis constitucionais e as leis ordinárias [artigo 161.º, alínea b), da Constituição] e, achando-se submetidas a um especial regime de aprovação e de alteração, não podem ser modificadas senão pela forma prevista no artigo 226.º, n.º 4, da Constituição. Esta circunstância impõe que se reconheça às suas disposições normativas maior perenidade, não só em face da rigidez do seu processo de alteração, mas também por ser uma lei onde se desenvolvem os princípios constitucionais respeitantes à autonomia regional e se concentram as bases dos poderes regionais [artigo 227.º, n.º 1, e 228.º, n.º 1, da Constituição]. A aludida rigidez decorre da circunstância de a Constituição haver concedido às Assembleias Legislativas das Regiões o exclusivo da iniciativa legislativa em matéria de Estatutos, reservando, simultaneamente, de forma abso luta, à Assembleia da República, a competência para a sua aprovação. O sistema permite supor que as matérias com assento estatutário resultam tendencialmente de um compromisso, pelo menos formal, entre cada uma das Regiões e a República, que se materializa no respectivo Estatuto e que constitui o fundamento da restrição ao poder de livre iniciativa legislativa na Assembleia da República. Esta restrição, no entanto, há-de ser aceite a título excepcional, pois não decorre de um critério relativo à sepa- ração e interdependência dos poderes soberanos do Estado, mas da adopção de um princípio de cooperação no relacionamento entre órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio das Regiões. E a verdade é que o Tribunal já recusou carácter estatutário a normas inscritas em preceitos dos Estatutos das Regiões. O Tribunal considerou, por exemplo, que não podem haver-se como materialmente estatutárias as nor- mas respeitantes a matérias relativas ao direito eleitoral (Acórdão n.º 1/91), à organização e funcionamento dos tribunais administrativos (Acórdão n.º 460/99) e às relações financeiras entre a República e as regiões autónomas (Acórdãos n. os 567/04, 11/07, 581/07 e 238/08). Nestes casos, o Tribunal verificou que as matérias tratadas se incluíam no âmbito da reserva de competência legislativa da Assembleia da República, tendo concluído que a sua inclusão nos Estatutos afecta essa reserva, por força da regra da iniciativa originária exclusiva das Assembleias Legis- lativas das Regiões”. Mais à frente, citando Jorge Miranda, é mencionado que “«competindo a iniciativa originária do Estatuto ou das suas alterações (como bem se compreende) à Assembleia Legislativa regional (artigo 226.º), se o estatuto pudesse abarcar qualquer matéria, ficaria, por esse modo, limitado o poder de iniciativa dos deputados, dos grupos parlamentares, de grupos de cidadãos ou do Governo da República (artigo 167.º)” (…). 6.2. Mas o Tribunal também já reconheceu que a disciplina jurídica de determinadas matérias há-de necessaria- mente incluir-se nos Estatutos. É o caso do estatuto dos deputados regionais (os seus específicos deveres, respon- sabilidades e incompatibilidades, assim como os seus direitos, regalias e imunidades), matéria obrigatoriamente regulada nos Estatutos, conforme dispõe o artigo 231.º, n.º 7, da Constituição (…). 6.3. O Tribunal tem também admitido que são materialmente estatutárias as normas dos estatutos que se refe rem aos poderes das regiões autónomas decorrentes do artigo 227.º da Constituição (…). De facto, os Estatutos estão ancorados, como explica Gomes Canotilho, «num princípio aberto: o princípio da autonomia regional». (…) É no conteúdo aberto desse princípio autonómico e nas exigências de adaptação
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