TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
350 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O que está em causa – como se salienta nas alegações do Ministério Público, convocando o princípio da pro porcionalidade – não é, porém, o estabelecimento de tal prazo, ou mesmo a sua normal suficiência para a dedução do pedido pelo trabalhador em situação de desemprego involuntário, mas antes a razoabilidade das consequências associadas ao incumprimento desse prazo. É que importa distinguir o direito global ou complexo às prestações emergentes da verificação de uma situação de desemprego relevante, podendo o período de concessão do subsídio de desemprego alcançar, nos termos do artigo 31.º, n.º 2, do Decreto‑Lei n.º 119/99, 30 meses (ainda susceptíveis dos acréscimos previstos no subsequente n.º 3) para os beneficiários com idade igual ou superior a 45 anos de idade (como era o caso da requerente, nascida em 14 de Setembro de 1948 – cfr. fls. 1 do processo administrativo anexo); e o direito a cada uma das prestações parcelares que sucessivamente se vão vencendo, a partir da data do requerimento. Nem a decisão recorrida nem o recorrente questionam que o retardamento injustificado na apresentação do requerimento pelo interessado – iniciando ou impulsionando o procedimento de verificação pela Segurança Social dos pressupostos ou condições da atribuição das prestações – possa fazer caducar ou precludir as prestações par celares que entretanto se poderiam ter vencido. O que se reputa inconstitucional, por desproporcionado, é o entendimento segundo o qual qualquer atraso no cumprimento do referido prazo peremptório de 90 dias dita a irremediável caducidade do direito global a todas as prestações. Como refere o recorrente, não se vê que as razões de segurança jurídica, subjacentes ao estabelecimento de prazos de caducidade, sejam suficientes para – com base em qualquer “mora” do trabalhador desempregado – o privar, na totalidade, da percepção de todas as prestações pecuniárias substitutivas das remunerações salariais per didas durante o período em que lhe deveriam ser concedidas, perdurando a situação de desemprego involuntário: a circunstância de a autora ter formulado a sua pretensão perante a Segurança Social apenas em 19 de Novembro de 2002 (quando o deveria ter feito até 9 de Agosto de 2002) não é susceptível de dificultar, de modo relevante, a actividade procedimental cometida à Segurança Social no âmbito do procedimento em causa, destinada essen cialmente a ajuizar da existência dos pressupostos e condições do direito às prestações de desemprego e calcular a respectiva duração e montante – sendo certo que tal “mora” dos trabalhadores sempre ditará a preclusão ou caducidade das prestações parcelares que se teriam vencido até à referida data de apresentação do requerimento. A estas considerações – que se sufragam – apenas se aditará que, tendo o subsídio de desemprego uma função sucedânea da remuneração salarial de que o trabalhador se viu privado e sendo a situação de desemprego, geradora do direito àquele subsídio, por natureza uma situação permanente e não instantânea, que se prolonga e renova no tempo, é de todo desrazoável fulminar com a perda definitiva e irreversível do direito ao subsídio de desemprego, por todo o tempo (futuro) em que o trabalhador a ele teria direito (que se pode prolongar por anos), por qualquer atraso na formulação inicial do pedido. A situação de desemprego involuntário, em que se funda o direito ao subsídio de desemprego, persistia no momento em que o pedido da sua concessão foi formulado e ter‑se‑á prolongado para além dessa data. Negar este direito, embora limitado ao período temporal em que se pode considerar ter sido tempesti vamente exercitado, significa, em termos substanciais, uma negação, sem motivo adequado, do próprio direito dos trabalhadores, constitucionalmente garantido, à assistência material em situação de desemprego involuntário. Toda esta argumentação foi igualmente adoptada no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 49/10, que se reportava à actual disposição do artigo 72.º, n.º 1, do Decreto‑Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, que reproduziu praticamente a do citado artigo 61.º, n.º 1, do Decreto‑Lei n.º 119/99. Em conformidade com essa jurisprudência – que é de manter – é de julgar inconstitucional a norma do artigo 61.º, n.º 1, do Decreto‑Lei n.º 119/99, por violação do princípio da proporcionalidade conjugado com o artigo 59.º, n.º 1, alínea e) , da Constituição da República Portuguesa, quando interpretada no sentido de que o incumprimento do prazo de 90 dias consecutivos a contar da data do desemprego para o interessado requerer à Segurança Social a atribuição do subsídio de desemprego determina a irremediável preclusão do direito global a todas as prestações a que teria direito durante o período de desemprego involuntário.
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