TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

357 ACÓRDÃO N.º 269/10 Tendo o recurso prosseguido, o Ministério Público alegou de modo a sustentar as seguintes con­ clusões: “66.° 1. A Lei n.º 74/98, com as alterações introduzidas pelas Leis n.º 2/2005, de 24 de Janeiro, n.º 26/2006, de 30 de Junho e n.º 42/2007, de 24 de Agosto, define e circunscreve rigorosamente o âmbito em que podem ser feitas rectificações a diplomas legais. 2. Subjacente, a um tal quadro jurídico, está a preocupação de assegurar que se não alterem diplomas fora do quadro definido pelos requisitos constitucionais e legais que legitimem uma tal alteração. 3. A Declaração de Rectificação n.º 21/2009, ao proceder, nos termos em que o fez, a alterações substanciais no texto do diploma que, aparentemente, vinha rectificar (Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprovou o novo Código do Trabalho), designadamente “recuperando” matéria contra-ordenacinal que deixara, entretanto, de vigo­ rar no ordenamento jurídico, por força da versão inicial da referida Lei, viola, assim, os princípios da não retroac­ tividade da lei penal (e contra-ordenacional), da segurança jurídica e da igualdade, decorrentes da Constituição da República Portuguesa (cfr. artigos 9.º, alínea b) , 13.º e 29.º, n. os 1, 3 e 4). 4. Com efeito, relativamente ao presente recurso, havia certas contra-ordenações de natureza laboral, que se encontravam previstas na Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto (Código do Trabalho de 2003). Posteriormente, porém, nos termos do art. 12, n.º 1, alínea a) , da versão original da Lei 7/2009, a Lei 99/2003 foi revogada, não havendo, no elenco das excepções previstas no n.º 3, alínea a) , deste artigo, nenhuma referência ao art. 671.º do mesmo diploma, que considerava a violação do art. 273.º como contra-ordenação muito grave; a referência, ao art. 671.º da Lei 99/2003, apenas foi introduzida, na citada Lei 7/2009, pela Declaração de Rectificação n.º 21/2009, não constando do texto inicial aprovado pela Assembleia da República. 5. Nestes termos, deve julgar-se inconstitucional a norma vertida na alínea a) , do n.º 3, do artigo 12.º do Códigodo Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, na versão constante da Declaração de Recti­ ficação n.º 21/2009, de 18 de Março de 2009, por violação dos arts. 112.º, n.º 1, 161.º, alínea c) , 166.º, n.º 3 e 168.º, n. os 1 e 2 da Constituição. 6. Com efeito, a pretensa “rectificação”, com a vultuosa dimensão da que foi efectuada pela Declaração de Rectif­icação n.º 21/2009, de 18 de Março de 2009, ultrapasse largamente o âmbito de aplicação que a Constituição autoriza e que a lei rigorosamente delimita para este efeito. 7. Nessa medida, nos presentes autos, uma tal actuação do legislador acaba por infringir, inapelável e nega­ tivamente, os princípios da não retroactividade da lei penal (e conta-ordenacional), da igualdade e da segurança jurídica, protegidos pela Constituição da República Portuguesa (cfr. artigos 9.º, alínea b) , 13.º e 29.º, n. os 1, 3 e 4 do texto constitucional). 8. Crê-se, pois, de manter o juízo de inconstitucionalidade feito pelo Tribunal a quo, quanto a esta parte da sua argumentação, com as consequências legais daí decorrentes. 9. Não se crê, todavia, de concordar com o digno magistrado a quo, quanto à invocada inconstitucionalidade decorrente do facto de o art. 12.º da Lei 7/2009 ter vindo criar “um vazio legal”, despenalizando uma conduta – por contraposição com a anterior legislação (Lei 99/2003, de 27 de Agosto) -, o que, no entender do mesmo magistrado, violaria o art.º 59.º da Constituição. 10. Desde logo, 4o se crê estar perante uma verdadeira omissão legislativa, pelo menos vo1urtária. Com efeito, a Lei 7/2009 (cfr. o proémio do n.º 3 do art. 12) previa, n sua versão inicial, a necessidade de uma regulamentação ulterior para diversas das suas disposições, apenas não tendo incluído uma referência ao art. 671.º da Lei 99/2003 (cfr. versão inicial do art. 12 n.º 3, al. a) , da Lei 7/2009) por aparente esquecimento do legislador, que procurou corrigir tal esquecimento – embora mal – através da Declaração de Rectificação 21/2009. 11. Ou seja, é pelo facto de o digno magistrado a quo ter previamente considerado – e bem, como se viu – que a Declaração de Rectificação 21/2009 era inconstitucional – solução essa, naturalmente, não pretendida pelo legislador – que a omissão legislativa ocorre, não se crendo de punir o legislador por um facto – omissão de um conduta – que, em rigor, não quis cometer.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=