TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
364 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL larga medida, ineficaz. E também pode assentir-se em que o direito de mera ordenação social é, no nosso orde namento, o meio de eleição para assegurar a tutela repressiva da generalidade das infracções a comandos deste tipo, em que está em causa o desrespeito por normas ordenadoras da actividade económica e da organização do trabalho, impondo condutas ao empregador, em ordem à prevenção do perigo, geralmente sem ressonância ética. Assim, pode concluir-se que a protecção do direito à saúde, higiene e segurança dos trabalhadores exige, além da normação que imponha obrigações aos empregadores a isso conducentes, o estabelecimento de adequa dos processos de fiscalização de infracções a cargo de entidades públicas e medidas sancionatórias adequadas e suficientes, designadamente a imediatividade repressiva que é assegurada pelas sanções contra-ordenacionais. Porém, quando não se trate de conteúdos de protecção constitucionalmente necessários (por directa mente impostos ou por ser manifesto que só uma única medida é concebível como eficiente), só pode falar-se de deficit de protecção censurável pelo juiz constitucional perante a patente ou indiscutível insuficiência das medidas normativas adoptadas. Ora, o elenco de medidas de protecção concebíveis é muito variável, como variados e multímodos são os riscos para a segurança e saúde dos trabalhadores. Por outro lado, é ao legis lador democraticamente legitimado que compete não só a prognose sobre o resultado das diversas medidas possíveis, mas também avaliar, ponderar e escolher em função do balanço entre o benefício esperado para os valores em causa e os custos económicos envolvidos. Portanto, logo no primeiro patamar, o das normas mate riais de desenvolvimento ou concretização do direito fundamental à segurança no trabalho, falha a base para que possa formular-se um juízo de inconstitucionalidade sobre a não previsão de sanção contra-ordenacional para as infracções aos deveres em causa. 10. Mesmo que assim se não entenda, designadamente por se considerar que as normas do n.º 2 do artigo 273.º do Código do Trabalho são o modo que o legislador entendeu adequado a cumprir o dever de prestação normativa primária que decorre da alínea c) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, com isso ficando assegurado e sincronicamente esgotado o correspondente espaço de discricionariedade, e que o que está em causa é o dever de “levar a sério” os direitos fundamentais assim concretizados, resta saber se a falta de imposição de um regime sancionatório para o seu desrespeito deixa flagrantemente inerme o conteúdo de protecção abstractamente concedido. Ora, não pode afirmar-se em absoluto que a falta de sanção prive de efectividade as normas infracons titucionais concretizadoras do direito fundamental à segurança. Com efeito, independentemente dos meios sancionatórios contra-ordenacionais ou criminais, em matéria de protecção da segurança, higiene e saúde do trabalho o Código de Processo do Trabalho regula um procedimento cautelar específico nos artigos 44.º e seguintes para “protecção, higiene e segurança no trabalho”, que pode ser utilizado pelos trabalhadores individual ou colectivamente. Processo cautelar especificado este que o legislador justificou no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 480/99, nos seguintes termos: “Ainda no domínio cautelar, e reflectindo as preocupações crescentes do ordenamento jurídico-laboral portu guês e do próprio direito comunitário em matéria de higiene, segurança e saúde no trabalho, e tendo em conta a incidência preocupante de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, com enormes custos humanos e económicos, directos e indirectos, cria-se ex novo, um procedimento especificado dirigido à protecção, daqueles valores, o que se crê poder vir a constituir um importante instrumento de pedagogia individual e social de sen sibilização de todos os intervenientes no mundo do trabalho, bem como um meio expedito e idóneo ao dispor dos trabalhadores para salvaguarda da respectiva saúde, quando não da própria vida, tudo sem prejuízo o dever de intervenção nesta matéria de quaisquer entidade competentes.” E, apesar das estatísticas de justiça e as publicações de jurisprudência não darem notícia de um efectivo uso de tal instrumento (vide Abílio Neto, Código de Processo do Trabalho Anotado, 4.ª edição, Janeiro de
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