TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

387 ACÓRDÃO N.º 280/10 aos chamados «regimes prestacionais», que constam do Capítulo II, em que se insere a referida norma do artigo 5.º Assim sendo, poderá dar-se como assente que não houve, no caso, autorização legislativa destinada a cobrir a aprovação da norma em causa e, por outro lado, o Governo não poderia, a pretexto do desenvolvi­ mento de uma norma que se circunscreva às bases gerais de um regime jurídico – como seja a do artigo 59.º da Lei n.º 10-B/96 – entrar no domínio de competência legislativa reservada. A questão que interessa seguidamente averiguar é a de saber se estamos, na verdade, perante matéria de reserva parlamentar. O artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da CRP (que corresponde, na sua primeira parte, ao artigo 168.º, n.º 1, alínea i) , na redacção anterior à Lei Constitucional n.º 1/97, vigente à data da publicação do Decreto- -Lei n.º 124/96), integra na reserva relativa da competência da Assembleia da República a «criação de impos­ tos e sistema fiscal»; ao passo que o artigo 103.º (que, por sua vez, corresponde ao artigo 106.º da Lei Funda­ mental, na mesma redacção), sob a epígrafe «sistema fiscal», no seu n.º 2, consigna o seguinte: «os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes». Entende-se que este n.º 2, introduzindo um princípio de legalidade fiscal, traduz a regra da reserva de lei para a criação e definição dos elementos essenciais dos impostos, nela abrangendo não somente os elementos intrusivos ou agressivos do imposto (criação, incidência, taxa), mas também os seus elementos favoráveis, como os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , I Vol., 4.ª edição, Coimbra, pp. 1090-1091). Como também tem sido afirmado, a reserva de lei para a criação e definição dos elementos essenciais dos impostos, mesmo nos aspectos favoráveis aos contribuintes, justifica-se em nome dos princípios da igual­ dade, da justiça e da transparência fiscal. Pretende-se que o imposto, quanto aos seus principais elementos, seja desenhado na lei de forma suficientemente determinada, sem margem para desenvolvimento regulamen­ tar, nem para a discricionariedade administrativa ( ibidem ). Uma tal determinação constitucional funciona assim como uma garantia dos contribuintes, no ponto em que procura criar um quadro legal rigoroso, colocando os sujeitos passivos do imposto a coberto de uma interpretação administrativa variável e porven­ tura menos publicitada. A justificação para a inclusão na reserva de lei dos benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes parece residir, por outro lado, na circunstância de esses serem elementos essenciais para a carac­ terização do sistema fiscal, o qual deverá ser objecto de uma apreciação global por parte dos representantes dos contribuintes (Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , Tomo II, 2006, Coimbra, pp. 220-221). Aceites estas considerações gerais quanto ao âmbito e razão de ser da reserva de lei em matéria fiscal, importa ter presente que a Constituição, fora dos casos de possível interferência com outras garantias em matéria penal, processual penal ou administrativa (tal como as consagradas nos artigos 29.º, 32.º e 268.º), não define expressamente o conteúdo da garantia dos contribuintes, nem estabelece um elenco taxativo de institutos que possam considerar-se incluídos nesse conceito, pelo que a caracterização de um determinado regime legal para efeito de incidência na reserva parlamentar constituirá sempre um problema de inter­ pretação da lei que terá de ser analisado à luz dos critérios gerais de hermenêutica jurídica (cfr. Ana Paula Dourado, O Princípio da Legalidade Fiscal – Tipicidade, conceitos jurídicos indeterminados e margem de livre apreciação , Coimbra, p. 138). Partindo da ideia de que a prescrição extingue o direito de exigir o pagamento da dívida e faz nascer para o contribuinte o direito de recusar a correspondente prestação, e incide, portanto, sobre um aspecto essen­ cial da relação jurídica tributária, consubstanciando uma garantia material ou não meramente procedimen­ tal, poderá entender-se, como vem sendo aceite pela doutrina, que integra uma garantia dos contribuintes (Benjamim Silva Rodrigues, “A Prescrição no Direito Tributário”, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Lisboa, 1999, pp. 261 e segs.; Casalta Nabais, Direito Fiscal, 5.ª edição, Coimbra, p. 347).

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