TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
388 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Nada permite concluir, porém, que a norma do artigo 5.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 124/96, aqui em análise, tenha vindo a restringir ou condicionar o regime que se encontra estabelecido, em geral, nessa maté ria, e possa assim ter posto em causa a função garantística da reserva de lei fiscal. O regime de prescrição das dívidas tributárias, antes consagrado no artigo 34.º do Código de Processo Tributário, encontra-se actualmente regulado, em termos gerais, nos artigos 48.º e 49.º da Lei Geral Tribu tária, incluindo no que se refere às causas interruptivas e suspensivas do respectivo prazo, e manteve plena mente a sua vigência, não obstante a publicação do Decreto-Lei n.º 124/96. Este diploma, por seu lado, teve em vista permitir a regularização de dívidas de natureza fiscal e à segurança social cujo prazo de cobrança voluntária tenha já terminado, através de medidas excepcionais de diferimento do pagamento em prestações mensais, até ao máximo de 150, implicando, como necessária decorrência, a suspensão do prazo de prescrição das dívidas durante o período de pagamento em prestações (artigo 5.º, n.º 5) e a suspensão dos processos de execução fiscal em curso ou daqueles que entretanto tenham sido instaurados contra os contribuintes devedores (artigo 14.º, n.º 10). Note-se, em todo o caso, que a sujeição ao regime previsto no diploma depende de apresentação de requerimento, por parte do devedor, e não é, por isso, coactivamente imposta aos interessados (artigo 3.º, n.º 1), e as dívidas que tiverem sido abrangidas pelo procedimento tornam-se exigíveis, nos termos gerais da lei tributária, em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 2 do artigo 3.º, e, designadamente, quando deixede ser efectuado o pagamento integral e pontual das prestações ou seja revogada a autorização conce dida pela Administração Fiscal. Estamos, por conseguinte, perante um regime específico de regularização de dívidas, instituído também no interesse do próprio contribuinte, que, por essa via, beneficia da possibilidade de pagamento faseado das dívidas e de redução dos juros que fossem devidos pela cobrança coerciva. Acresce que a suspensão do prazo de prescrição das dívidas durante o período de pagamento em prestações, como determina o citado artigo 5.º, n.º 5, desse diploma é um pressuposto necessário do próprio regime legal assim instituído. O prazo de prescrição dos impostos periódicos foi fixado pelo artigo 48.º, n.º 1, da Lei Geral Tribu tária em oito anos a contar do termo do ano em que ocorreu o facto tributário (o artigo 34.º do Código de Processo Tributário fixava em 10 anos o respectivo prazo prescricional, com idêntico termo inicial), e o diferimento do pagamento das dívidas fiscais, por efeito da adesão ao regime definido no Decreto-Lei n.º 124/96, pode atingir 150 prestações mensais, que corresponde a uma dilação temporal de doze anos e meio. Assim sendo, a suspensão do prazo de prescrição das dívidas durante o período de pagamento em prestações é uma condição de exequibilidade do próprio regime legal, pois que, de outro modo, a adesão dos contribuintes devedores ao plano faseado de pagamento implicaria inevitavelmente a própria extinção da dívida remanescente, caso se mantivesse em curso o prazo prescricional. Em todo este condicionalismo, qualquer contribuinte que tenha aderido ao regime de regularização de dívidas fiscais através do pagamento em 150 prestações mensais, não poderia invocar qualquer expectativa legítima relativamente à possibilidade de o prazo prescricional continuar a decorrer enquanto se mantivesse em vigor o procedimento especial de pagamento em prestações. Se a função garantística da reserva de lei fiscal, como se deixou esclarecido, visa assegurar a previsibi lidade dos elementos essenciais do imposto (e da situação fiscal) e a tutela de confiança do contribuinte, torna-se claro que nenhum motivo existia para uma intervenção parlamentar, no caso vertente, quando o que estava em causa era apenas a definição de uma solução jurídica que era exigida pela lógica do sistema e que se encontrava justificada à luz dos princípios gerais em matéria tributária. De facto, a regularização de dívidas fiscais que o Decreto-Lei n.º 124/96 pretendeu regulamentar, não se enquadra na reserva de lei fiscal, tal como esta está configurada nos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, e constitui antes competência legislativa concorrente do Governo, que lhe era con ferida pelo artigo 201.º, n.º 1, alínea a) , da Constituição, na redacção então vigente. A suspensão do prazo de prescrição das dívidas durante o período de pagamento em prestações, tal como previsto no artigo 5.º, n.º 5, desse diploma, reporta-se a um aspecto lateral desse específico regime legal, que é inerente às soluções
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