TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
389 ACÓRDÃO N.º 280/10 normativas nele contidas, não introduzindo qualquer alteração no regime geral dos impostos (incluindo em matéria de prescrição), nem qualquer alteração que não fosse esperada pelos contribuintes. A referida disposição legal não se encontra, por isso, contrariamente ao sustentado no acórdão recorrido, ferida de inconstitucionalidade orgânica. III — Decisão Termos em que se decide conceder provimento ao recurso, devendo a decisão recorrida ser reformada de acordo com o presente juízo sobre a questão de constitucionalidade. Sem custas. Lisboa, 5 de Julho de 2010. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria João Antunes – Carlos Pamplona de Oliveira – Joaquim de Sousa Ribeiro – Gil Galvão – Maria Lúcia Amaral – Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano (com declaração de voto que junto) – Vítor Gomes (vencido, conforme declaração anexa) – Ana Maria Guerra Martins (vencida, nos termos da declaração do Exm.º Senhor Conselheiro Vítor Gomes) . – José Borges Soeiro (vencido fundamentalmente pelas razões aduzidas pelo Exm.º Conselheiro Vítor Gomes, para que, com a devida vénia, remeto) – Rui Manuel Moura Ramos . DECLARAÇÃO DE VOTO Votei o presente Acórdão pelas razões que passo a expor. A decisão recorrida tinha recusado a aplicação da norma contida no n.º 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, por considerar que a mesma sofria de inconstitucionalidade orgânica, por ter sido emitida pelo Governo sem a necessária autorização da Assembleia da República. Dispondo a norma recusada sobre a suspensão do prazo de prescrição de dívidas fiscais e à segurança social, está em causa o âmbito do princípio da legalidade fiscal na dimensão de exigência de reserva de lei parlamentar. Na verdade, na época da aprovação daquele diploma governamental o artigo 168.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição da República Portuguesa (CRP), determinava que era da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo, a definição do sistema fiscal, aí se incluindo, conforme resultava do artigo 106.º, n.º 2, da CRP, as garantias dos contribuintes, designadamente o regime da prescrição dos créditos tributários, abrangendo as causas de suspensão dos prazos de prescrição. A aprovação pelo Governo do disposto no n.º 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, não foi autorizada pela Assembleia da República. A exigência que o sistema fiscal deve ser definido pelo parlamento, não deixa de ter justificação no princípio dos ideais liberais no taxation without representation, correspondente à ideia de que, sendo o im posto um confisco da riqueza privada, a sua legitimidade tem de resultar duma aprovação dos representantes directos do povo, numa lógica de auto-tributação, auto-imposição e auto-consentimento, a qual permitirá a escolha de tributos bem acolhidos pelos contribuintes e, por isso, eficazes (sobre uma mais aprofundada jus tificação da reserva de lei fiscal, vide Ana Paula Dourado, na ob. cit ., pp. 75-84, e Casalta Nabais, em Direito Fiscal , p. 136, da 5.ª edição, da Almedina). Ora, estando a sujeição ao regime previsto no Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, dependente de apresentação de requerimento por parte do devedor (artigo 3.º, n.º 1), o mesmo não é coactivamente imposto aos contribuintes, pelo que deixa de fazer sentido a exigência que esse regime emane da Assembleia
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