TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

402 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional: I — Relatório No Processo Comum, com tribunal singular, n.º 1066/05.2TAVIS, pendente no 1.º Juízo Criminal de Viseu, A., foi condenado, por sentença proferida em 5 de Março de 2008, pela prática de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 107.º, n.º 1, e 105.º, n.º 1, do RGIT, 26.º, 30.º, n.º 2, e 79.º, do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 15. O arguido recorreu desta decisão para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão proferido em 28 de Janeiro de 2010, negou provimento ao recurso. O arguido recorreu desta decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), pedindo que se «reconheça que a interpretação de que o limite de € 7 500,00, a que alude o n.º 1, do artigo 105.º, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 113.º, da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, não é aplicável ao crime de abuso de confiança contra a Segu­ rança Social previsto no artigo 107.º, do RGIT, é inconstitucional por violação dos princípios da legalidade e tipicidade constitucionalmente consagrados no artigo 29.º, da CRP.» Foi proferida decisão sumária em 8 de Abril de 2010 de não conhecimento do recurso, com a seguinte fundamentação: «(…) A intervenção do Tribunal Constitucional não incide, pois, sobre a correcção jurídica do concreto julgamento, diga ele respeito aos factos da causa, à actividade de interpretação ou de determinação da lei aplicável ou, ainda, à qualificação jurídica dos factos dentro do quadro normativo tomado como aplicável, mas apenas sobre a confor­ midade constitucional das concretas normas que foram aplicadas pela decisão recorrida tendo como referência o próprio tipo legal. Acerca da questão em apreço, na parte referente aos poderes de cognição do Tribunal Constitucional quando estão em causa violações do princípio da legalidade criminal resultantes do confronto da actividade interpretativa com o tipo legal circunstancialmente em causa, afirma Rui Medeiros ( A Decisão de Inconstitucionalidade – Os au- tores, o conteúdo e os efeitos da decisão de inconstitucionalidade da lei , Universidade Católica Editora, Lisboa, 1999, pp. 340 a 342; na jurisprudência deste Tribunal, cfr. Acórdãos n. os 674/99, 383/00 e 183/08, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ) : «A conclusão adoptada não significa, porém, que o Tribunal Constitucional possa fiscalizar a constitucionali­ dade, não já da norma determinada através do processo de integração de lacunas, mas antes do próprio processo de obtenção da regra aplicável. A questão ganha particular relevância nos domínios em que existe uma proibição constitucional de recurso à analogia. É o que sucede, concretamente, com o princípio constitucional da legalidade em matéria penal. Há quem entenda que cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que, aplicando analogicamente uma norma incriminadora, violam o princípio constitucional da legalidade em matéria penal. Não duvidamos que essa é a solução mais consentânea com a lógica do recurso de amparo ou da queixa cons­ titucional. Mas, já o sabemos, o legislador constitucional português não quis introduzir um sistema semelhante ao da acção constitucional de defesa de direitos fundamentais. Ora, independente da questão de saber se a violação do nullum crimen sine lege stricta envolve ou não uma inconstitucionalidade directa, a verdade é que, quando invoca a proibição da analogia, o que o recorrente suscita é «a inconstitucionalidade do acto de julgamento e não a inconstitucionalidade de uma norma jurídica». Sem dúvida que, nos casos em que um tribunal interpreta uma

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