TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

404 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E, aceitando-se que o controlo a exercer pelo Tribunal Constitucional é um “controlo normativo”, não pode todavia o Tribunal Constitucional, na análise da “extensão” desse controlo, ter em atenção as especificidades da natureza, sentido e alcance da fiscalização concreta de constitucionalidade, por contraponto, nomeadamente, à natureza, sentido e alcance da fiscalização abstracta da constitucionalidade, à qual se admite ser aplicável a inter­ pretação jurídica constante da douta decisão sumária. Com efeito, ao contrário da fiscalização abstracta, a fiscalização concreta incide sobre (e sempre sobre) uma norma tal como foi aplicada ou desaplicada na decisão recorrida, isto é, na sua incidência limitada ao caso concreto. Esta referência sublinhada não pode ser entendida apenas quanto à extensão dos efeitos da decisão do Tribunal Constitucional, devendo necessariamente ser entendida ao nível do sentido e extensão deste controlo neste âmbito específico. Com efeito, não existe na generalidade dos casos inconstitucionalidade de uma norma “de per si”, existe inconstitucionalidade de urna norma analisada, interpretada e aplicada com um determinado sentido e alcance, podendo mesmo concluir-se que em abstracto e dada a riqueza e multiplicidade de interpretações, alegadamente jurídicas, muitas vezes simuladamente jurídicas, de normas, a todas as normas será sempre admissível dar uma interpretação conforme com a constituição. À contrário, todas as normas que, em abstracto e que nunca determinada interpretação mais literal, normal e/ou previsível serão conformes com a constituição, podem, numa outra interpretação num caso concreto, terem ou assumirem um sentido e alcance violador dos princípios constitucionais, como se entende ser o caso dos autos. Ora, o Tribunal constitucional, no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade, não pode alijar as responsabilidades de controlo que tem e tem que exercer a este nível, situação que só se compreende por razões “políticas” de controlo e gestão do numero de recursos e sua adequação aos meios existentes por forma a garantir a funcionalidade do sistema mas que não se compreende no âmbito, estrito, como deveria ser, da efectiva aplicação e realização da justiça. E nunca é demais lembrar que a recente e progressiva desacreditação da justiça junto da sociedade civil e sua manifesta perda de credibilidade e respeito por parte de outros órgãos de soberania advém em muito da “politiza­ ção” das suas decisões, da necessidade de, em muitas interpretações jurídicas, dar resposta a necessidades ou suprir graves faltas e irresponsabilidades políticas, muitas delas manifestadas no âmbito legislativo. Aliás, ao recorrente não restam dúvidas de que a genética situação concreta dos autos, que não a do recurso de constitucionalidade, teve inicialmente um interpretação jurídica, subscrita por muitos ilustres e conceituados “trabalhadores” de direito e da justiça, interpretação que depois se viu vergada pelos interesses “políticos”, tendo sido penoso ver esses ilustres e conceituados trabalhadores do direito vergar a sua isenção e pena mais do que à sua consciência, às pressões hierárquicas infra e extra – judiciais pela necessidade de colmatar mais uma vez uma eventual irresponsabilidade legislativa. Tudo para concluir que o controlo normativo que o Tribunal constitucional tem que exercer é sempre e neces­ sariamente o controlo de uma determinada e concreta interpretação de uma norma, que é o controlo que o recor­ rente pretendeu submeter a este Tribunal e melhor explicitar nas suas alegações, e que vê negado na douta decisão sumária, que o pretende vencer, sem convencer, vencer pela ausência de audição das razões concretas e vencer até pelos custos impostos ma decisão, totalmente inadequados a uma decisão sumária, também aqui embarcando a justiça numa maré “politica” de limitar o acesso e realização da justiça através do mais injusto e inadequado argu­ mento que é o de tornar o recurso à mesma inacessível pelos custos de comporta, e inacessível criando entraves formais à submissão das razões do recorrente a uma verdadeira decisão de mérito. A justiça realiza-se, afirma-se e credibiliza-se vencendo e convencendo com uma decisão de mérito. Desacredita-se vencendo com decisões formais que fogem á apreciação do mérito, decisões que, por isso, devem ser a excepção e para casos de manifesta falta de requisitos que se entende, salvo o devido respeito, não ser o dos autos. O recorrente não pretende sindicar a bondade ou mérito do julgamento mas a constitucionalidade da norma interpretada no sentido em que Tribunais comuns a interpretaram a final, que não inicialmente, interpretação que, é certo, pode ter, teve e terá reflexos na decisão final de julgamento mas sem que ambos os níveis de análise se confundam ou conflituem. Termos em que deve a presente reclamação ser julgada procedente e ordenado o prosseguimento dos autos de recurso.»

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