TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
474 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ser considerados, inclusive para os efeitos previstos na alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, não menos exacto é que os mesmos elementos do conselho de administração continuaram a ser também aquilo que já antes eram, ou seja, administradores de uma sociedade de economia mista eleitos com a maioria do capital público e, por essa razão, designados por entidade pública para o cargo. E se assim é, a subordinação de qualquer deles ao regime jurídico do controlo público da riqueza em razão do cargo não se encontra na dependência da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 71/2007, o que torna irrelevante a circunstância de esta, reportando-se a 26 de Maio de 2007, ser posterior à data em que certos deles foram eleitos e tomaram posse do cargo, ou seja, a Março de 2007. 21. A terceira e última objecção prende-se com o sentido e o alcance do regime da Lei n.º 4/83, alterada pela Lei n.º 25/95, apontando, por isso, para considerações de ordem teleológica. Segundo os requerentes, deverá considerar-se que tal regime pressupõe uma clara diferenciação entre administradores nomeados pelo Governo ou outras entidades públicas e administradores eleitos em assem- bleia geral de sociedades com capitais públicos [o artigo 4.°, n.º 3, alínea b) , da Lei n.º 4/83], não podendo ter o efeito de equiparar administradores designados pelo Governo – ou que, em qualquer caso, visem representar a posição e os interesses do Estado – e os administradores de sociedades de economia mista, mas apenaso de equiparar àqueles os administradores designados por entidades públicas diversas do Estado, como, por exemplo, as regiões autónomas ou as autarquias locais. A importância do conhecimento e da caracterização da finalidade prosseguida pelo legislador através do preceito jurídico sob aplicação, singularmente ou no contexto da unidade do conjunto jurídico em que se insira, na determinação do sentido e do alcance que em definitivo lhe deverá ser fixado é consensual e recor- rentemente realçada na doutrina. Na expressiva observação de Baptista Machado, «[…] o esclarecimento da ratio legis [….] revela a valo- ração ou ponderação dos diversos interesses que a norma regula e, portanto, o peso relativo desses inter- esses, a opção entre eles traduzida pela solução que a norma exprime. Sem esquecer ainda que, pela desco berta daquela racionalidade, que (por vezes inconscientemente) inspirou o legislador na fixação de um certo regimejurídico em particular, o intérprete se apodera de um ponto de referência que ao mesmo tempo o habilita a definir o exacto alcance da norma e a discriminar outras situações típicas com o mesmo ou com recorte diferente» ( Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador , Almedina, 1983, p. 183). Assim sendo, pergunta-se: a finalidade prosseguida pelo legislador através do regime jurídico de con- trolo público da riqueza em razão do cargo legitimará ou autorizará a diferenciação entre administradores nomeados pelo Governo ou outras entidades públicas e administradores eleitos em assembleia geral de socie- dades com capitais públicos e com a intervenção determinante desse capital, designadamente para o efeito, aqui directamente em causa, de considerar que apenas os primeiros se encontram a ele subordinados? Para a caracterização da finalidade que presidiu à revisão do regime jurídico do controlo da riqueza pública em razão do cargo operada pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, constitui importante subsídio o teor dos trabalhos preparatórios do referido diploma, em especial dos projectos de lei que estiveram na sua origem: os projectos de lei 52/VI, 544/VI, 561/VI e 569/VI. De entre os quatro, ressalta a nota justificativa inserta no projecto de lei 569/VI, incluindo ela a seguinte passagem que é útil aqui recordar: «A legislação institucionalizando a obrigação de declarar o património, as actividades e funções privadas e os interesses particulares dos titulares de cargos públicos deriva da vontade de moralizar e melhorar a transparência da vida pública. E funciona para verificar a existência (ou não) de incompatibilidades, em apoio à fiscalização exercida nos termos da legislação própria, ou em substituição da criação de possíveis incompatibilidades. A sua importância fundamental prende-se com as situações às quais se entenda não estender o regime das incompatibilidades.
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