TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

76 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Simplesmente, a solução vai longe demais, sendo patentemente desproporcionada à prossecução do objec­ tivo de combater a criação de verdadeiros impostos sem os resguardos e as garantias constitucionalmente exi­ gidos. Ela, na verdade, leva a tratar igualitariamente (como impostos) todas as prestações exigidas pelo levan- tamento de um obstáculo jurídico a uma actividade privada, se esta não se traduzir na utilização de um bem semipúblico, sem levar em conta a natureza finalística desse obstáculo, a razão de ser da sua existência e a concomitante configuração real do interesse protegido. Esta orientação não separa aquilo que pode e deve ser separado, já que todas as “taxas” devidas por licenças que não se projectem na utilização de um bem semipúblico são tratadas como licenças fiscais, apagando a autonomia e a especificidade, sob o ponto de vista constitucional­ mente relevante, das chamadas licenças administrativas ou policiais – aquelas, no dizer de Alberto Xavier ( ob. cit ., p. 53), “estabelecidas predominantemente por razões gerais de ordem administrativa”. A distinção a fazer não é, assim, entre as remoções que facultam e as que não facultam a utilização de um bem semipúblico, mas entre as que afastam um obstáculo real, ditado por um genuíno interesse admi­ nistrativo, e as que eliminam um obstáculo artificialmente erguido para, através da remoção, propiciar à Ad- ministração a cobrança de uma receita (cfr., quanto a esta distinção, Casalta Nabais, ob. cit ., pp. 14-15, Autor que, no entanto, considera “verdadeiras licenças fiscais” as taxas relativas à publicidade através de anúncios). O tratamento, de modo constitucionalmente adequado, das prestações devidas pela concessão de licen- ças municipais não exige a diferenciação que o critério restritivo de taxa propugna, mas uma outra, decor- rente do indispensável controlo sobre a verdadeira funcionalidade do obstáculo cujo levantamento justifica a contrapartida pecuniária. O modo de combater a “fuga” para o regime mais benévolo das taxas, sem que a natureza substancial da relação com o administrado o legitime, passa, como acentua Cardoso da Costa, por esse meio – o do «teste de verosimilhança, destinado (…) a afastar a qualificação de “taxa” nos casos em que ela se ligue à remoção de um obstáculo “artificial”, criado apenas para se proporcionar a cobrança de uma receita (dito por outras palavras, nos casos em que à criação do obstáculo não vá subjacente um interesse “administrativo” autónomo, mas unicamente um interesse “fiscal”» ( ob. loc. cit .). 11. Assente que há prestações conexas, sem mais, ao licenciamento de um comportamento dos particu- lares, a que cabe, também do ponto de vista das valorações constitucionais, a qualificação como taxa, cumpre ajuizar, por último, se o tipo de situações de que o caso vertente é exemplo se integra nessa categoria. Está em causa, como já vimos, a colocação de um anúncio luminoso num prédio particular. Seja qual for a materialidade concreta desse reclamo e o modo do seu posicionamento no prédio – matéria sobre a qual não há elementos nos autos – não sofre dúvidas de que o local de implantação do suporte físico da pub- licidade se situa em domínio privado, num imóvel de propriedade privada. Mas isso não invalida que, pelo seu modo funcional de ser, a actividade publicitária assente em painéis ou inscrições se projecte visualmente no espaço público, interferindo conformadoramente na configuração do ambiente de vivência urbana das colectividades locais. A fixação do âmbito de incidência da taxa em questão leva em conta isso mesmo, pois só são taxados “os anúncios que se divisem da via pública” (observação 1), aplicável às normas do Capítulo IV, em que se integra a do artigo 31.º da Tabela de Taxas anexa ao Regulamento em causa). Na busca da máxima perceptibilidade e do maior impacto da respectiva mensagem junto dos potenciais consumidores ou utentes dos produtos ou serviços publicitados, o anunciante utiliza, com muita frequência, formas agressivas de comunicação, em termos luminosos, gráficos ou, até, de dimensão e destaque físicos, pelo que a visualização tem verdadeiros efeitos intrusivos, no ambiente de vida comunitária. Contrariamente ao que transparece de algumas apreciações, a questão não se resolve, pois, pela simples demarcação “física” dos espaços privado e público, determinando-se a legitimidade da qualificação como taxa pela “ocupação” de um ou de outro, por parte da fonte emissora da mensagem publicitária. «É que – faz-se notar na referida declaração de voto do Conselheiro Benjamim Rodrigues – a utilidade essencial e determi- nante na óptica do utilizador que o obrigado do tributo obtém pela via do pagamento do tributo não é pro- priamente a utilidade traduzida na afixação ou inscrição dos anúncios nos bens do domínio privado mas sim, essencialmente, a utilidade dos mesmos poderem ser visíveis e tidos em conta por quem circula nos espaços

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