TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
80 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I — Relatório 1. Em acção de impugnação de paternidade movida por A. , em que se suscitou a questão da caduci- dade da propositura da acção por incumprimento do prazo previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 1842.º do Código Civil, o Supremo Tribunal de Justiça, em recurso de revista, julgou inconstitucional a referida norma, recusando a sua aplicação no caso concreto, por considerar que o prazo nela previsto limita despro- porcionadamente a possibilidade de impugnação da paternidade a todo o tempo pelo presumido progenitor, ofendendo ao direito à identidade previsto no artigo 26.º da Constituição. Ali se decidiu: «(…) 1. Face ao preceituado no art. 1842.º n.º 1 alínea a) do C. Civil, dúvidas não pode haver de que ocorreu a dita caducidade do direito de acção, como foi o entendimento das instâncias. Essa norma exige que a acção de impugnação da paternidade pelo marido da mãe seja intentada no prazo de dois anos a contar da data em que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se pela sua não paternidade. Ora, conjugando a sua afirmação de que as relações sexuais com a mãe do menor cessaram em 1990 e o facto de ter tido conhecimento da sua existência e da data do seu nascimento, pelo menos quando foi citado para a acção de regulação do poder paternal, antes de Março de 1994, desde então estava na posse de factos que lhe permitiam concluir pela sua não paternidade. Pelo que a acção teria de ser proposta, na melhor das hipóteses, até Março de 1996. E só foi intentada em 2005. (…) 2. A questão que se coloca é a de saber se a caducidade em causa estabelece um limite desproporcional ao valor constitucional que o exercício do direito de acção em causa pretende salvaguardar. Por outras palavras, trata-se de averiguar se o dito prazo de caducidade, não permite, na prática, que seja devidamente garantido esse valor. (…) O Acórdão do TC n.º 23/06 de 10.01, declarou inconstitucional, com força obrigatória geral, a norma do n.º 1 do art. 1817.º n.º 1 do C. Civil, que prevê a extinção por caducidade do direito de investigar a paternidade a partir dos 20 anos de idade do filho, conforme o art. 26.º n.º 1 da Constituição, reconhecendo que o direito do filho ao apuramento da paternidade biológica é uma dimensão do “direito fundamental à identidade pessoal”. Tratando-se de estabelecer a paternidade, invoca-se, pois, o direito à identidade – na vertente de se saber de onde se vem, ou de quem se vem, dos art. os 25.º n.º 1 e 26.º n.º 1 da Constituição – que não seria devidamente acautelado se a acção que o concretiza estivesse sujeita ao dito prazo de caducidade. A questão que se vem colocando é a de saber se esta doutrina é aplicável às acções de impugnação da pater- nidade, que no art. 1842.º n.º 1 alíneas a), b) e c) do C. Civil, estão sujeitas a diversos prazos de caducidade, consoantesejam elas propostas, respectivamente, pelo marido, pela mãe, ou pelo filho. No Acórdão do TC n.º 473/07 – DR II Série 18.01.08 – , entendeu-se: “Há inevitavelmente uma diferença de grau entre a investigação da paternidade, em que pantentemente está em causa o direito à identidade pessoal do investigante (e relativamente ao qual a imposição de um limite temporal pode implicar a violação do direito ao conhecimento da identidade dos progenitores), e a impugnação da paterni dade, em que releva a definição do estatuto jurídico do investigante em relação a um vínculo de filiação que lhe é atribuído por presunção legal. (itálico nosso)”. “…não estará aqui em causa um direito à identidade pessoal, entendida no sentido há pouco explanado do direito ao conhecimento da identidade dos progenitores (que tem apenas relevo para a acção de investigação da paternidade), mas o direito ao desenvolvimento da personalidade na dimensão de um direito de autoconformação da identidade que não poderá deixar de ser reconhecido em relação ao presumido pai...”
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=