TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

94 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL que constitui o objecto desta pretensão. A questão prende-se com um dos requisitos de cuja verificação a lei faz depender a admissibilidade do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. Exige, com efeito, o n.º 2 do artigo 72.º da LTC que tais recursos “só podem” ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer. Em jurisprudência constante, o Tribunal tem entendido esta exigência no sentido de o recorrente estar obrigado a identificar com o necessário rigor uma determinada questão de inconstitucionalidade normativa, por forma a que o tribunal comum dela possa conhecer. E, salientando-se a circunstância de, em fiscalização concreta, o Tribunal ter apenas competência para sindicar normas jurídicas aplicadas nas decisões dos tribunais e não as próprias decisões desses tribunais, tem-se entendido que não pode haver-se como suscitação adequada aquela que não corresponda a uma enunciação normativa, mas à mera indicação de um sentido genérico não coincidente ao que é defendido pelo interessado, a qual, obviamente, não habilita o tribunal a extrair o sentido preciso da norma que seria inconstitucional. A necessidade de individualização do segmento normativo, ou de enunciação do sentido ou interpre- tação normativa que o recorrente reputa inconstitucional torna-se evidente quando o preceito em causa se reveste de várias dimensões ou sentidos interpretativos, susceptíveis de suscitar questões de constituciona- lidade diversas, eventualmente passíveis de tratamento autónomo (caso dos Acórdãos n. os 116/02, 21/06, 450/06, 578/07 e 131/08). Compreende-se, por isso, que o ónus de suscitação de forma clara e precisa da questão de constitucionalidade se não basta com uma afirmação genérica de que uma “diferente interpre- tação” normativa será violadora da Constituição (Acórdãos n. os 376/06 e 141/08), que não revela de forma clara e perceptível o exacto sentido normativo considerado inconstitucional (Acórdãos n. os 21/06, 126/07, 50/08, 476/08, 16/09), por não identificarem “positiva e expressamente” o preciso sentido normativo que, na perspectiva do recorrente, padece de inconstitucionalidade (Acórdão n.º 244/07). No presente caso, porém, há que reconhecer que, na sua alegação, o recorrente identificou com suficien­ te clareza a questão normativa perante o tribunal comum, por forma que este não teve dificuldade em a identificar e em a decidir. E, isto, porque, circunscrevendo a questão a apenas duas soluções possíveis retira- das da mesma norma, o recorrente identificou perfeitamente uma delas, e acusou a restante (“outro entendi- mento”) de enfermar de inconstitucionalidade. Ficou, assim, identificada a questão de inconstitucionalidade normativa, com menção dos preceitos legais de onde é retirada a norma, o que inequivocamente habilita “os operadores do direito [...] a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado por, desse modo, afrontar a Constituição.” Não há, pois, razões que obstem ao conhecimento do objecto do recurso. 3. Impõe-se agora precisar o objecto do presente recurso, uma vez que o recorrente interpôs recurso da decisão concluindo pela inconstitucionalidade do segmento normativo resultante das normas contidas nos artigos 61.º, n.º 5, 61.º, n.º 1, artigo 64.º, n.º 2, artigo 53.º e 54.º, todos do Código Penal, interpretados no sentido de que o tempo que o arguido passou em liberdade condicional sem cometer qualquer crime não deve ser considerado tempo de prisão e como tal descontado no tempo de prisão que ao condenado falta cumprir em virtude da revogação da liberdade condicional, violando o direito à liberdade, previsto no texto constitucional no seu artigo 27.º Conforme jurisprudência consolidada neste Tribunal, apenas pode conhecer-se das normas que hajam sido efectivamente aplicadas por parte do tribunal a quo . Decidiu-se, na decisão da Relação de Coimbra, o seguinte: [...] Face ao conteúdo das conclusões a questão que importa decidir consiste em saber se, havendo revogação da liberdade condicional, o período em que o arguido esteve em liberdade condicional deve ou não deduzir-se ao cumprimento da pena de prisão. Como é sabido a concessão da Liberdade Condicional assenta num juízo de prognose, decorrente da análise de vida anterior do arguido, da sua personalidade, a evolução da mesma no decurso da execução da pena de prisão, de

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