TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

99 ACÓRDÃO N.º 181/10 A liberdade condicional denominada de «obrigatória» visa criar uma fase de transição entre a prisão e a liberdade, destinada a permitir ao condenado integrar-se de modo definitivo na comunidade após um período de afastamento motivado pela prisão, tendo-se em conta que esse afastamento da comunidade era particularmente prolongado no caso dos condenados a pena de prisão superior a 6 anos. E visa, ao mesmo tempo, facilitar a reintegração social do agente e bem assim permitir o exercício de um certo controlo sobre a sua inicial inserção na comunidade. As mesmas razões justificam a previsão da concessão da liberdade condicional obrigatória nos casos em que, não se tratando de uma pena de prisão superior a 6 anos, se esteja perante uma soma de penas que devam ser cumpridas sucessivamente e que exceda 6 anos de prisão (situações de pluralidade de crimes prati- cados pelo mesmo agente que não dão lugar à realização de cúmulo jurídico). As alterações entretanto introduzidas pela revisão de 2007, levada a efeito pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, trouxeram a seguinte redacção ao artigo 64.º do Código Penal, que prescreve: “1 – É correspondentemente aplicável à liberdade condicional o disposto no artigo 52.º, nos n. os 1 e 2 do artigo 53.º, no artigo 54.º, nas alíneas a) a c) do artigo 55.º, no n.º 1 do artigo 56.º e no artigo 57.º 2 – A revogação da liberdade condicional determina a execução da pena de prisão ainda não cumprida. 3 – Relativamente à pena de prisão que vier a ser cumprida pode ter lugar a concessão de nova liberdade condi- cional nos termos do artigo 61.º” A disciplina relativa aos pressupostos e duração da liberdade condicional (pressupostos formais e mate­ riais) manteve o regime saído da revisão penal de 1995, apenas acrescentando o segmento final do n.º 5 («considerando-se então extinto o excedente da pena»), que não constitui mais que do que a concretização e esclarecimento normativo específico sobre as consequências do cumprimento dos tempos e das finalidades da liberdade condicional, mas que já se retirava da remissão para o artigo 57.º, efectuada pelo artigo 64.º, n.º 1, do Código Penal para aquela norma. Mantém, assim, à liberdade condicional a natureza de incidente de execução da pena de prisão, por a respectiva aplicação depender sempre do consentimento do condenado (artigo 61.º, n.º 1, do Código Penal), apenas assim se afastando a crítica de, através da liberdade condicional se estar a permitir uma socialização forçada ou coactiva; e por a sua duração não poder ultrapassar o tempo de pena que ainda falta cumprir (ar- tigo 61.º, n.º 5, do Código Penal) – que se justifica à luz da finalidade preventivo-especial de reintegração do agente na sociedade e do princípio da necessidade de tutela de bens jurídicos (artigo 40.º do Código Penal). 7. O condenado em prisão superior a seis meses pode beneficiar da liberdade condicional em três momentos do cumprimento da pena: a meio da pena, a dois terços da pena ou a cinco sextos da pena, con- forme os requisitos do artigo 61.º do Código Penal. A concessão da liberdade condicional, em todas as suas vertentes, constitui uma medida de excepção, no cumprimento da pena, visando a suspensão da reclusão, por forma a criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, assim permitindo que o recluso possa ganhar a orientação social que, presumivelmente, o período de encarceramento enfraqueceu. Até à entrada em vigor do actual Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, a concessão da liberdade condicional implicava pois, (com excepção da concedida pelos 5/6 da pena, que é obrigatória), a ocorrência simultânea de circunstâncias que traduzem, no fundo, a finalidade da execução da própria pena, e a capacidade ressocializadora do sistema com vista a prevenir a prática de futuros crimes. Tal instituto, assente num juízo de prognose, que permite antecipar, verificados que se mostrassem os requisitos enunciados nos n. os 2 e 3 artigo 61.° do Código Penal, que o condenado, em liberdade, irá conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes. E ainda de considerar que, nos termos do disposto no artigo 42.° do mesmo diploma legal, a execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de futuros crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável.

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