TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
147 acórdão n.º 465/12 SUMÁRIO: I – Não restam dúvidas que a Constituição protege especialmente o trabalho e a condição de quem o exerce, sendo a atividade de quem trabalha concebida pela ordem constitucional não como um mero instrumento de sobrevivência económica, mas, mais do que isso, valorada como pressuposto de afir- mação da dignidade das pessoas e da sua autonomia. II – Precisamente porque o trabalho é, para a ordem constitucional, um valor, a dignidade de quem tra- balha, a que se refere especialmente a alínea b) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, encontra uma refração clara na garantia que a lei ordinária dá ao trabalhador, segundo a qual este último não ficará à mercê da inatividade que seja injustificadamente imposta pela entidade patronal. III – Embora as relações laborais sejam marcadas pela especial vulnerabilidade de um dos seus sujeitos, e seja intenção da ordem constitucional proteger nessa relação a parte mais frágil, tal não chega para que o intérprete possa afirmar que, por causa disso, o valor “trabalho” ocupa no sistema de bens jus-funda- mentais uma posição hierárquica tal, em relação a outros bens, que por si só justifique a inversão dos princípios gerais do ónus da prova em processos jus-laborais. Nenhum motivo há para que se conclua que o valor ou bem “trabalho” merece, quanto a este ponto, um tratamento preferencial ou excecional. IV – Esta inversão poderá vir a ser decidida pelo legislador ordinário, que assim ponderará como conciliar diferentes bens constitucionais que eventualmente conflituam – em identificadas circunstâncias – entre si. Mas nada na Lei Fundamental permite concluir que tal inversão do ónus da prova se dá, nos processos jus-laborais, independentemente da lei, e apenas por força da proteção que a ordem consti- tucional dispensa ao trabalho e à condição do trabalhador. Não julga inconstitucional a norma decorrente dos artigos 342.º, 343.º e 344.º do Código Civil, bem como do artigo 516.º do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual o regime do ónus da prova se aplica em direito processual laboral, fazendo impender sobre o trabalhador, nomeadamente, o encargo de provar a violação do seu direito à ocupação efetiva. Processo: n.º 595/11. Recorrente: Particular. Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral. ACÓRDÃO N.º 465/12 De 1 de outubro de 2012
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