TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
262 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL última distinção competencial é, como referido anteriormente, uma consequência da operacionalização em 2002 da política de descentralização vertida na Lei n.º 159/99, de 14 de setembro. Finalmente, há que ter em conta a longa duração da licença de exploração de postos de abastecimento de combustível: em regra, 20 anos (cfr. o artigo 15.º, n. os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de no- vembro; cfr também supra o n.º 13). Durante todo o período da licença, pode ser exercida a atividade licen- ciada, que, recorde-se, impacta negativamente em bens públicos. Ou seja, a remoção do obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares – e não parece poder questionar-se, à luz dos interesses públicos a tutelar, a legitimidade de tal regime de licenciamento – não opera instantaneamente, mas permanece durante todo o período de vigência da licença. Considerando conjuntamente todos estes aspetos, a interrogação que se pode formular é a de saber se um município, obrigado a suportar permanentemente no seu espaço público interferências decorrentes de uma atividade económica sujeita a procedimentos públicos de licenciamento previstos em legislação especial e igualmente aplicável à Administração municipal e à Administração central, que, todavia, não considera nem faz relevar tais impactes negativos para efeitos de fixação das taxas aplicáveis, pode, por sua iniciativa, e em ordem à prossecução das suas atribuições nos domínios afetados pela atividade licenciada, tributá-la, tomando como referência as licenças previamente atribuídas. Noutros termos: será que a «remoção do obstá- culo jurídico ao comportamento dos particulares» a que se refere o artigo 3.º do RGTAL, como pressuposto das taxas, é necessariamente específico de uma dada taxa, ou pode ser comum e, por conseguinte, valer para outras taxas conexionadas com dimensões da atividade licenciada não consideradas na fixação da taxa que remove o obstáculo jurídico em causa? O caso sub iudicio exemplifica bem a importância da questão: será compatível com o princípio da autono- mia das autarquias locais admitir que estas não possam impor taxas sobre atividades que interferem de forma re- levante com bens jurídicos que lhes cabe tutelar apenas porque na legislação especial respeitante ao licenciamen- to da mesma atividade se consideram exigências diferentes e muito relevantes do ponto de vista técnico, mas que ignoram por completo a aludida dimensão de interferência permanente com bens públicos municipais? No Acórdão n.º 177/10 este Tribunal entendeu que “a constituição da obrigação passiva de se confor- mar com essa influência modeladora é justamente a contrapartida específica que dá causa ao pagamento da taxa, estruturando, em termos bilaterais, a relação estabelecida com o obrigado tributário”. Mas, como mencionado pelo tribunal recorrido, também aí se considerou que “findo o prazo para o qual tinha sido concedida a remoção da proibição do exercício da atividade publicitária, torna-se necessário proceder à rea- valiação da situação, do ponto de vista da permanência das condições legais de licenciamento, o que justifica a cobrança de uma nova prestação tributária. Essa reavaliação é um pressuposto da continuidade da fruição, por um novo período, das utilidades propiciadas por tal atividade, no que o particular se mostra interessado. Não faz sentido, atenta essa relação causal, distinguir o licenciamento da sua renovação, ou a contrapartida devida pelo período inicial das que são exigíveis pelos períodos de renovação da licença. Assim como, nou- tra dimensão problemática, não há razões para considerar a taxa de publicidade consumida por anteriores quantias devidas para a realização de outros trâmites de que eventualmente depende a utilização de edifícios privados para fins publicitários”. Ora, a grande diferença no caso sujeito é que a taxa a aplicar nos termos do artigo 70.º, n.º 1, 1.1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008 pressupõe já o benefício da remoção do obstáculo jurídico, isto é, a licença de exploração de postos de abastecimento de combustíveis. O que aquela taxa vem valorar é, no quadro de tal licenciamento, aspetos ainda nele não considerados, uma vez que o licenciamento em causa é determinado por lei especial que não tem de tomar em linha de consideração a especificidade dos interesses municipais. Será que, por ser assim, fica a taxa do artigo 70.º, n.º 1, 1.1, des- provida de uma estrutura bilateral? A resposta deve ser negativa, uma vez que o licenciamento dos postos de abastecimento de combustíveis nos termos do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de novembro, removendo embora um obstáculo jurídi- co, não toma – e, em rigor, nem pode tomar, atento o princípio da autonomia das autarquias locais – em
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