TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
268 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 6. Veja-se, por absurdo, um exemplo-limite. Faria sentido que o legislador ordinário, estabelecendo o direito a um terceiro grau de jurisdição em matéria penal, dele excluísse os que fossem condenados a pena de prisão superior a 8 anos? É óbvio que não. Isso nem mereceria discussão. 7. Vejamos, agora, a situação dos autos. Até à reforma de 2007, havendo dupla conforme, o acesso ao Supremo Tribunal dependia da gravidade do crime em pauta aferida em função da respetiva moldura penal (o que, no caso de concurso de infrações, deu azo a uma jurisprudência contraditória e conflituante, que se arrastou durante anos). Com a reforma de 2007, o legis- lador escolheu um novo critério, objetivo e de fácil aplicação: tem direito ao recurso para o Supremo Tribunal, mesmo havendo dupla conforme, quem tenha sido condenado a pena de prisão superior a 8 anos. Isto é, o legis- lador adotou o critério da gravidade da pena, ou seja, da repercussão concreta para o arguido da condenação de que foi alvo, só admitindo um terceiro grau de jurisdição quando essa gravidade se traduza numa pena de prisão superior a 8 anos. 8. Neste âmbito, que sentido é que faz – entre os condenados com pena superior a 8 anos de prisão – distinguir a situação daqueles que o foram por causa de um único crime daqueles outros que o foram por força do cúmulo derivado da prática de uma pluralidade de crimes? E a resposta só pode ser que tal distinção não faz sentido. Se o critério é a gravidade da pena (isto é, o castigo infligido), parece ser indiferente se isso é o resultado de uma pena única ou do cúmulo de penas parcelares. E, assim sendo, quando a pena superior a 8 anos de prisão é o resultado do cúmulo de penas parcelares de montante inferior, não é razoável que o arguido só tenha acesso ao Supremo Tribunal para discutir o cúmulo e já não as matéria decisórias referentes aos crimes e às penas parcelares, que são, afinal, e por regra, na substância da condenação, o mais relevante, condicionando os termos da pena única aplicada. 9. Ora, quando o Supremo Tribunal limita o direito ao recurso com base no critério irrazoável e desproporcio- nado que elegeu – de resto, à margem do que manifestamente desejou o legislador ordinário –, está a ofender os valores que a Constituição assegura. 10. Pelo exposto, o entendimento dado pelo acórdão recorrido ao artigo 400.º n.º 1- f ) do CPP, no sentido de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não há recurso para o STJ relativamente à matéria decisória dos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos, é inconstitucional, por ofensa do direito ao recurso consagrado no artigo 32.º n.º 1 da CRP, que é restringido em termos desproporcionados, irrazoáveis e iníquos. Conclusões A) O tema do recurso é de enunciação muito simples: é ou não desproporcionado – em termos constitucio- nalmente relevantes – o entendimento dado pelo Supremo Tribunal de Justiça ao artigo 400.º n.º 1- f ) do CPP, no sentido de que – havendo uma condenação com uma pena superior a 8 anos de prisão – não hã recurso para o STJ relativamente à matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão? B) Divergindo da posição do Supremo Tribunal, os Recorrentes entendem que a questão está em saber se, consagrado um terceiro grau de jurisdição, as limitações ao seu exercício respeitam ou não os princípios constitucionais que informa os direitos fundamentais e o processo penal. C) Neste âmbito, que sentido é que faz – entre os condenados com pena superior a 8 anos de prisão – distin- guir a situação daqueles que o foram por causa de um único crime daqueles outros que o foram por força do cúmulo derivado da prática de uma pluralidade de crimes? E a resposta só pode ser que tal distinção não faz sentido. Se o critério é a gravidade da pena (isto é, o castigo infligido), parece ser indiferente se isso é o resultado de uma pena única ou do cúmulo de penas parcelares. D) E, assim sendo, quando a pena superior a 8 anos de prisão é o resultado do cúmulo de penas parcelares de montante inferior, não é razoável que o arguido só tenha acesso ao Supremo Tribunal para discutir o cúmulo e já não as matéria decisórias referentes aos crimes e às penas parcelares, que são, afinal, e por regra, na substância da condenação, o mais relevante, condicionando os termos da pena única aplicada.
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