TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

210 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 9. Reafirma-se esta perspetiva e é também em função dela que se impõe analisar o presente recurso. A questão que aqui se coloca é a de saber se é constitucionalmente legítimo que a decisão da relação que julga inverificados os pressupostos processuais de um recurso que fora admitido – no caso a tempestividade de interposição do recurso – seja, ela própria, insindicável por via de recurso quando, como é o caso, dela resultará o imediato trânsito em julgado da decisão da primeira instância que condena o arguido numa pena de prisão superior a 8 anos de prisão, da qual seria possível recorrer se a relação confirmasse, em apreciação de mérito, essa mesma condenação [artigo 400.º, n.º 1, alínea f ) , do CPP]. Na situação processual dos autos, o arguido, depois de ver admitido pela primeira instância o recurso por si interposto da decisão condenatória, foi confrontado na Relação com uma decisão do relator, depois confirmada em conferência, que considerou que o recurso tinha sido interposto fora de prazo, uma vez que este corria em férias judiciais, por virtude de um dos crimes que constituía objeto do processo se integrar na categoria dos crimes de violência doméstica. Esta situação empresta à dimensão normativa sub judicio , como já se disse, uma diferença de tomo rela- tivamente àquela que foi objeto de apreciação no acórdão que vimos referindo. No caso, embora a decisão sobre a irrecorribilidade surja ex novo no tribunal superior, o arguido recorrente teve oportunidade de fazer reapreciar pela formação de julgamento uma primeira decisão sobre a questão proferida pelo relator. Diver- samente, na situação apreciada no Acórdão n.º 107/12, estava em causa uma dimensão normativa segundo a qual a decisão da Relação é irrecorrível para o Supremo, mesmo que a rejeição do recurso que conduz ao trânsito em julgado de uma condenação cuja confirmação permitiria esse recurso tenha sido tomada sem que o arguido tivesse efetiva possibilidade de sobre ela se pronunciar. É certo que, embora não privado do direito de se fazer ouvir sobre as razões da rejeição do recurso, o recorrente não viu a mesma questão que a motiva apreciada por dois tribunais diferentes. Mas, embora no seio do mesmo tribunal superior, obteve dupla apreciação, por formações diferentes: uma decisão singular do relator e uma decisão da formação colegial de julgamento. Sendo assim, o que se sujeita à apreciação do Tribunal Constitucional, no presente recurso, é saber se a solução normativa de irrecorribilidade da decisão da relação que julga intempestivo recurso que fora admi- tido pela primeira instância é inconstitucional, quando o arguido tenha podido exercer plenamente, perante o tribunal superior, o direito de defesa relativamente a tal questão. Ora, a necessidade do recurso deve aferir-se em função da sua utilidade como instrumento de garantia do direito de defesa do arguido. Como se disse no Acórdão n.º 107/12, “a efetivação do direito de defesa do arguido torna-se tão mais premente quanto mais intensos forem os efeitos que da decisão judicial decorrem para a sua esfera jurídica, sendo que nesta se incluem, não apenas os direitos fundamentais que a Constitui- ção reconhece a qualquer cidadão, mas também aqueles que esta especialmente concede ao arguido enquanto visado por um concreto processo penal. E nesta última categoria necessariamente se integra o próprio direito ao recurso, tendo em linha de conta que é tão gravosa a decisão condenatória como aquela que não admite o recurso dela interposto”. Importa lembrar que, apesar de o recurso ter sido admitido em 1.ª instância, o recurso deve ser rejeitado na Relação, por despacho do relator, entre outras situações, se tiver sido interposto fora do prazo [cfr. artigos 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, alínea b), e 420.º, n.º 1, alínea b) , do CPP]. Desta decisão cabe reclamação par a conferência, podendo o arguido fazer-se ouvir pela formação colegial que seria competente para apreciar o recurso sobre quanto seja pertinente à questão da admissibilidade do recurso (n.º 8 do artigo 417.º do CPP). Ora, se o recurso não tivesse sido admitido em 1.ª instância, o recorrente poderia reclamar dessa decisão nos termos do artigo 405.º do Código de Processo Penal, tornando-se a decisão do Presidente da Relação definitiva (sem prejuízo do recurso de constitucionalidade) se confirmasse o despacho de indeferimento, mesmo nos casos de condenação em pena que, se confirmada, poderia abrir a porta ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. As duas situações equivalem-se substancialmente no que se refere ao exercício dos direitos de defesa. Não se afigura que deva considerar-se menos respeitador das garantias do arguido a pronúncia sobre a

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