TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

336 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL zação com poderes de investigação criminal; em concreto, estão em causa documentos, utilizados como prova num processo penal, que haviam sido entregues no cumprimento de deveres de cooperação com a administração tributária quando esta se encontrava no exercício de atividades inspetivas e fiscalizadoras necessárias ao apuramento de uma determinada situação tributária, colocando-se a questão de saber se a possibilidade de utilização dos documentos facultados à administração tributária, no cumprimento do referido dever de colaboração, como prova em procedimento criminal deduzido com fundamento nos resultados da referida inspeção, implica uma compressão do princípio nemo tenetur se ipsum accusare, importando apreciar se tal restrição é ou não constitucionalmente aceitável. IV – A resposta a essa questão terá de passar pela verificação dos pressupostos enunciados no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, como condição da admissibilidade de restrições a direitos, liberdades e garan- tias: estarem essas restrições previstas em lei prévia e expressa, de forma a respeitar a exigência de legalidade e obedecerem tais restrições ao princípio da proporcionalidade, tendo como finalidade a salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente garantidos. V – Quanto ao primeiro pressuposto de admissibilidade dessas compressões, dúvidas não restam no sen- tido de que as restrições em análise resultam de previsão legal prévia e expressa, com caráter geral e abstrato, mostrando-se por isso respeitadas as exigências decorrentes do princípio da legalidade; no que respeita ao segundo dos pressupostos, as restrições em causa são funcionalmente destinadas à salvaguarda de outros valores constitucionais, ou seja, tais restrições estão previstas no quadro das funções exercidas pela administração tributária destinadas ao apuramento da situação tributária dos contribuintes, sendo que não se poderá deixar de reconhecer a importância e necessidade dessa fis- calização, sendo imprescindível quer a imposição de deveres de cooperação aos contribuintes, quer a possibilidade da posterior utilização dos elementos recolhidos em processo penal desencadeado pela verificação de indícios de infração criminal. VI – Acresce que a restrição em causa respeita o critério da proporcionalidade, sendo adequada, isto é, constituindo um meio idóneo para a prossecução e proteção dos referidos interesses merecedores de proteção constitucional, e necessária, em virtude da mesma corresponder quer a um meio exigível no sentido de obter o fim da eficiência do sistema fiscal. VII – Por outro lado, as referidas restrições respeitam a proporcionalidade em sentido estrito, uma vez que se podem considerar equilibradas, visto que contêm mecanismos flanqueadores que salvaguardam uma adequada ponderação dos concretos bens jurídicos constitucionais em confronto. VIII –Acresce que assistirá também ao contribuinte sujeito a fiscalização, o direito a requerer a sua constitui- ção como arguido, sempre que estiverem a ser efetuadas diligências destinadas a comprovar a suspeita da prática de um crime, o que permitirá que este passe a dispor dos direitos inerentes ao respetivo estatuto, designadamente o direito à não autoincriminação; por outro lado, a utilização como prova em processo penal de documentos obtidos na atividade de fiscalização tributária, não deixará de ser proibida quando se revele que a entidade fiscalizadora tenha desencadeado ou prolongado deliberada- mente a fase inspetiva, com a finalidade de recolher meios de prova para o processo penal a instaurar, abusando do dever de colaboração do contribuinte. IX – Assim, numa ponderação entre o princípio nemo tenetur se ipsum accusare e a restrição que ao mesmo é imposta no caso concreto e os valores constitucionais que se pretendem salvaguardar com essa ­restrição,

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