TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013

662 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Esta associação de vontades constrói-se na dinâmica própria da vida quotidiana do partido. Da militância que permite o conhecimento mútuo dos militantes entre si e em níveis para o efeito tidos por razoáveis. Com efeito, a vontade do partido vai formando-se justamente, através da participação ativa e livre dos mili- tantes nas reuniões e assembleias dos seus órgãos deliberativos, onde apresentam argumentos, refutando posições, aceitando e rejeitando ideias. É esta participação que conduz ao conhecimento mútuo dos camaradas militantes e que no mínimo se reputam ou ficcionam no número mínimo de duzentos para a candidatura a Secretário-Geral do Partido: cerca de 0,1% do seu total. E não se ignora que a organização do partido assenta a nível local, distrital, regional e nacional, em estruturas descentralizadas territorialmente (Secções, Concelhias e Federações), sendo que são deveres dos filiados [artigo 11.º, n.º 1, al a) ], militar nas secções em que se encontrem inscritos e nos órgãos em que participem, bem como tomar parte nas atividades do partido em geral; Desta militância deverá emergir assim uma relação de associação entre camaradas que conduza a um seu mútuo conhecimento das pessoas, de tal forma que, quem pretende candidatar-se ao relevante cargo do Partido deverá no mínimo poder dizer aos seus proponentes: “Eu conheço-vos, vocês conhecem-me”, conhecimento esse a revelar-se a não ser necessário o recurso aos ficheiros que contém dados pessoais dos militantes. Neste enquadramento facilmente se conclui não ser essencial à formalização da candidatura a Secretário-Geral do Partido a consulta e o acesso ao recenseamento, à base de dados pessoais dos seus militantes. Seria absurdo se, imagine-se, cerca de mil militantes a pretender candidatar-se a Secretário-Geral e o Partido, a sua organização se ter de confrontar com a obrigação legal de a todos eles ter de facultar o acesso ao recenseamento dos seus filiados. Seria absurdo se, imagine-se, num país de cerca de dez milhões de cidadãos eleitores, mil preten- derem candidatar-se ao mais alto cargo da nação e o Governo se ter de confrontar com a obrigação legal de a todos eles ter de facultar o acesso ao recenseamento dos cidadãos. Ora, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as melhores soluções, as mais acertadas (artigo 9.º, n.º 3 do CC), pelo que se chegarmos a soluções absurdas como as acabadas de exemplificar, devemos concluir que o legislador, no caso o legislador estatutário, não as quis consagrar. E assim a pretensão do impugnante está manifestamente de encontro às já enunciadas normas que devem proteger os dados pessoais dos militantes do partido. E reconhece-se que no interior do Partido Socialista, como no interior de qualquer associação coletiva de direito privado não pode haver diferenciações arbitrárias ou injustificadas entre os seus militantes ou membros, mas não se vê como no caso presente, onde pode estar em causa o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado, que tem aqui a ver sobretudo com a igualdade de posições em matéria de direitos e deveres. Em conformidade acordam na Comissão Nacional de Jurisdição e com a presente fundamentação, em negar provimento à impugnação, confirmando-se a decisão da Comissão Organizadora do XIX Congresso do Partido Socialista (COC). (…)» Na ata da CNJ relativa à deliberação de 14 de março de 2013 consta ainda uma Declaração de voto manuscrita de um dos membros da Comissão com o seguinte teor: «Votei favoravelmente o presente Acórdão no entanto entendo que o mesmo é tempestivo nos termos do dis- posto no n.º 1 do artigo 7.º do Regulamento Processual e disciplinar do PS». Cumpre apreciar e decidir.

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