TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

101 acórdão n.º 581/14 direito fundamental, ainda que relativo (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, Jorge Miranda – Rui Medeiros, Tomo I – 2.ª edição, pp. 1254 – 1256). Não há dúvida que, no contrato de arrendamento urbano para habitação, encontramos como objeto um imóvel urbano e finalidade a habitação (cfr. artigo 1067.º, n.º 1, do Código Civil), enquanto que o arrendamento rural tem como objeto, por regra, um imóvel rústico e finalidade a atividade agrícola, florestal ou outras atividades de produção de bens ou serviços associados à agricultura, à pecuária ou à floresta (cfr. artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de outubro). É certo que, como veio a verificar-se no caso sub judice , pode ocorrer a instalação da habitação do arrendatário rural numa das construções existentes no prédio rústico, porém daí não decorre de per si a alteração da finalidade do contrato e, menos ainda, que tal elemento do seu objeto haja de ser destacado ou autonomizado relativamente aos restantes elementos que o integram (cfr. artigo 4.º, n. os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de outubro), por forma a merecer um tratamento jurídico distinto do resto do objeto do contrato, antes pelo contrário, todos os elementos inte- grantes daquele devem submeter-se plenamente ao regime jurídico orientador de tal contrato, sob pena de se colocar em crise a sua economia e comprometer a concretização do seu fim de forma excessiva. Tudo vale por dizer que se não está perante realidades jurídico-materiais iguais, mas sim diversas, como seja, ‘contrato de arrendamento de imóvel para habitação (urbano)’ e ‘contrato de arrendamento rural’, independentemente de no objeto deste se integrar construção (imóvel urbano) ocupada pelo arrendatário para sua habitação, elemento este que, por isso, carece de qualquer autonomia justificadora de regime jurídico diverso daquele a que, legal e contratualmente, se encontra sujeito o objeto de que é parte integrante. Do exposto resulta, portanto, que o legislador, mau grado a disponibilidade conformadora do conteúdo do contrato supra referenciada, não haja que estabelecer um regime jurídico idêntico para a ‘habitação’ no âmbito do arrendamento urbano e, bem assim, do arrendamento rural, inserindo o diferimento da desocu- pação em ambos, porquanto, tratando-se de realidades jurídico-materiais diversas, o não estabelecimento de tal desiderato legal em ambos é insuscetível de integrar violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição, enquanto princípio negativo de controlo e proibição do arbítrio como limite externo da liberdade de conformação (cfr. J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República , ano- tada, 4.ª edição, vol. I, p. 339, nota V ao artigo 13.º). Aliás, do regime jurídico do arrendamento rural resultam também garantias adequadas para a desocupação. 10. Invoca, ainda, o recorrente que a norma impugnada viola o disposto nos artigos 64.º e 65.º da Constituição, ou seja, respetivamente, o direito à (proteção da) saúde e o direito à habitação. É certo que a proteção do bem jurídico saúde se encontra constitucionalmente consagrado, como o Tribunal teve já oportunidade de afirmar, designadamente no Acórdão n.º 423/08 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ): «(…) A Constituição refere-se à proteção da saúde em vários preceitos do Título III relativo aos “Direitos e deveres económicos, sociais e culturais” da Parte I que incide sobre “Direitos e deveres fundamentais” [vejam-se, por exemplo, o direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover – artigo 64.º da CRP; o direito dos consumidores à proteção da saúde – artigo 60.º, n.º 1, da Constituição; o direito dos trabalhadores à prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde” – artigo 59.º, n.º 1, alínea c) , da Lei Fundamental]. A proteção do bem jurídico saúde está, pois, constitucionalmente consagrada a vários títulos. Porém, inserindo-se o direito à proteção da saúde no Título III da Parte I da Constituição relativo aos direitos económicos, sociais e culturais, terá de se averiguar se ele extravasa de uma dimensão positiva (de direito prestacio- nal), para, em certos casos, assumir uma dimensão negativa de proibição de condutas de terceiros lesivas do bem jurídico saúde. A doutrina tem vindo a realçar o desdobramento do direito fundamental à proteção da saúde consagrado no artigo 64.º da CRP numa vertente positiva – direito a prestações do Estado – e numa vertente negativa – direito

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