TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

113 acórdão n.º 582/14 III – Decisão Pelos fundamentos expostos o Tribunal decide:  a) não julgar inconstitucional a norma constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto, na interpre- tação segundo a qual o auferimento de uma indemnização por danos não patrimoniais deve ser tomada em consideração para efeitos de cancelamento do apoio judiciário concedido no âmbito do próprio processo em que aquela foi decretada; b) não conceder provimento ao recurso; c) condenar o recorrente em custas, fixadas em 25 unidades de conta da taxa de justiça. Lisboa, 17 de setembro de 2014. – Maria Lúcia Amaral – Maria de Fátima Mata-Mouros – José Cunha Barbosa (vencido, nos termos da declaração que junto) – Joaquim de Sousa Ribeiro. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencido nos termos e pelos fundamentos que se expõem de seguida. A interpretação normativa em crise no presente recurso de constitucionalidade parte do pressuposto de que o auferimento de uma indemnização ressarcitória por danos não patrimoniais, porque constitui rendimento, altera positivamente a situação económica do beneficiário de apoio judiciário. Esta é uma opção suspeita, sobretudo se atentarmos a que uma indemnização por danos não patrimoniais não constitui, quando decretada por decisão judicial, rendimento para efeitos de tributação, de acordo com o disposto nos artigos 9.º, n.º 1, alínea b) , e 12.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, dela não advindo para o contribuinte, portanto, qualquer capacidade de gastar. Isto ocorre porque subjacente à indemnização ressarcitória devida em virtude do direito à reparação dos danos, consagrado no artigo 483.º do Código Civil, está o intuito quer da reintegração da esfera do lesado na situação anterior ao dano, no caso dos danos patrimoniais, quer da atenuação do mal causado pelo dano mediante satisfação de necessidades variadas, no caso dos danos não patrimoniais (cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral , vol. I, 10.ª edi- ção, 2013, p. 604). Porém, mesmo admitindo que as características específicas de uma compensação devida por danos não patrimoniais – concretamente, o facto de a ela estarem subjacentes danos cujo montante é de difícil cálculo, ou de não lhe ser estranha a “ideia de reprovar ou castigar no plano civilístico e com meios próprios do direito privado, a conduta do agente” (cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 10.ª edição, 2013, p. 608) – viabilizam a sua imputação no rendimento para efeitos de proteção jurídica, é patente que a norma em crise não logra superar outros obstáculos constitucionalmente relevantes. Não se nega, claro está, que a melhoria superveniente da situação económica do agente, assim como a sua degradação, podem e devem ter repercussões quanto ao apoio judiciário, nos processos já a decorrer. No entanto, quando o legislador ordinário admite que essa melhoria possa advir de quantias auferidas, em sede de indemnização ou compensação, no âmbito do processo para que foi previamente concedido tal apoio, essa opção colide, desde logo, com o desiderato de garantir a igualdade de oportunidades no acesso à justiça, e, nessa medida, com o princípio do acesso ao direito e aos tribunais. Atente-se, com efeito, no seguinte. O direito à reparação dos danos (cfr. artigo 483.º do Código Civil), inclusivamente dos danos não patrimoniais, assume-se, no entender de alguns, como um direito fundamental extraconstitucional, categoria

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