TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

139 acórdão n.º 587/14 condiciona, entre o mais, a interpretação dos preceitos incriminadores, proibindo o recurso à analogia/ integração de lacunas, como, aliás, decorre, expressamente, do artigo l.º, n.º 3, do CP. VI – A interpretação enunciada vai mais além do que a mera interpretação restritiva da norma revogatória do artigo 28.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, a qual, desde logo, não poderá ser tida como conforme a CRP. VII – Na realidade, tal interpretação apresenta-se como uma verdadeira integração de aparente lacuna legal, na senda do que prevê o artigo 10.º, n.º 3, do CC, dispositivo, porém, inaplicável em sede da definição de tipos incriminadores, atentos os princípios da legalidade e da tipicidade que subjazem a toda a dimensão jurídico-penal. VIII – Mas, ainda que se situasse o teor da decisão recorrida no âmbito da mera interpretação restritiva da lei, a ver- dade é que também essa dimensão normativa da interpretação padeceria de evidente inconstitucionalidade. IX – Pois, por um lado, a interpretação preconizada em apreço viola o princípio da prevalência da constituição, o qual impõe que, dentre as várias possibilidades de interpretação, só deve escolher-se uma interpretação não contrária ao texto e programa da norma ou normas constitucionais, bem como viola o dever de aplicação do direito legal em conformidade com os direitos liberdades e garantias, na medida em que tal interpretação afronta o princípio da legalidade previsto no artigo 29.º da C.R.P., inserido no âmbito dos direitos, liberda- des e garantias constitucionalmente consagrados, nos termos supra expostos, quando a letra e o espírito da lei permitiam, ou mesmo impunham, outra interpretação conforme à C.R.P. X – Por outra via, mesmo sendo admissíveis, em abstrato, as interpretações extensivas de normas incriminado- ras ou as interpretações restritivas de normas descriminalizadoras, a verdade é que tais interpretações não podem exceder o teor literal das significações possíveis e adequadas segundo o entendimento comum das palavras do texto legal, sob pena de se estar a criar direito, devendo considerar-se proibidas e violadoras do princípio da legalidade constitucionalmente consagrado as interpretações que o façam. XI – No caso presente, tendo sido, como expressamente foi, revogado um preceito que tipificava determinada conduta como crime, ressuscitá-lo através de interpretações aparentemente restritivas, mas que, no fundo, traduzem verdadeira integração de lacuna, além de consubstanciar uma violação do princípio da legalidade põe, obviamente, em causa a segurança jurídica, a justiça material e os direitos de defesa do arguido. XII – Pelo argumentos aduzidos o tribunal ad quem deverá decidir pela não aplicação do Acórdão uniformizador aos presentes autos por força da disposição constante do artigo 204.º da C.R.P. que impõe que nos feitos submetidos a julgamento, não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consagrados. (...)» 6. O Ministério Público contra-alegou nos seguintes termos: «(...) VIII – Conclusões 62. Pretende o recorrente nos presentes autos, A., ver apreciada a constitucionalidade da “interpretação con- jugada das normas contidas nos artigos 28.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, e no artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, quando interpretadas no sentido de que não obstante a derrogação operada pelo artigo 28.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, o artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, manteve-se em vigor não só quanto ao cultivo como relativamente à aquisição ou detenção, para consumo próprio, de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV, em quantidade superior à necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 (dez) dias (…)”. 63. Fundamenta, o recorrente, o seu pedido de declaração da inconstitucionalidade da interpretação norma- tiva identificada, na “(…) flagrante violação do reduto nuclear dos direitos e garantias do arguido, mormente, os

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