TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

142 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 29 de novembro, teria sido descriminalizada a detenção para consumo de estupefacientes em quantidade que exceda o consumo médio individual durante o período de 10 dias. Contudo, este não é um entendimento unânime. Noutros arestos, alguns deles recentes, o Tribunal chegou a conclusão diametralmente oposta, não vislumbrando obstáculos a que, em certos domínios norma- tivos, se controlasse a conformidade do processo hermenêutico seguido pelo tribunal recorrido com o prin- cípio da legalidade criminal ou com o princípio da legalidade fiscal (cfr. os Acórdãos n. os 141/92, 205/99, 183/08 e 186/13, disponíveis e m www.tribunalconstitucional.pt ). C ontrariando a argumentação expendida supra, logrou-se um entendimento nos termos do qual a recondução destas hipóteses ao objeto de controlo não deveria ser entendida uma situação de sindicância do ato de julgamento nem tampouco como uma interferência ilegítima nas competências dos tribunais ordinários. De facto, talqualmente consta de declara- ção de voto aposta ao Acórdão n.º 383/00 (disponível e m www.tribunalconstitucional.pt ): «(…) Em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade normativa, há que distinguir – apesar das inevitáveis dificuldades teóricas e práticas suscitadas – entre tudo o que é resultado da ponderação do caso concreto subme- tido ao tribunal, e que releva da decisão, daquilo que é a adoção de critérios normativos. E que releva da norma aplicada. Ora, quando um tribunal extrai, a partir de uma fonte, um critério normativo válido para uma série de casos, utilizando um processo hermenêutico também considerado válido para esses casos, não é o singular ato de julgamento que está em causa, nem a concreta decisão do tribunal em que esse ato se consubstancia. Pelo contrário, nessas hipóteses a questão é manifestamente de constitucionalidade normativa. Uma coisa é a bondade de uma dada interpretação, e outra, bem distinta, é a contrariedade à Constituição dessa mesma interpretação. Uma disposição penal pode ser objeto de diferentes interpretações compatíveis com o princípio da legalidade. O que este princípio proíbe é que o julgador alcance, contra o princípio nullum crimen sine lege certa, uma norma cujo conteúdo ultrapassa o sentido possível das palavras da lei. (…)» Ou seja, muito embora a opção por um modelo de controlo normativo tenha visível respaldo na Cons- tituição, não resultando exclusivamente de uma solução legal nem tampouco de uma interpretação jurispru- dencial, certo é que há que conjugar esta impostação com as demais regras e princípios constitucionais. Na verdade, se a Constituição consagra, no seu artigo 29.º, n.º 1, o princípio da legalidade criminal, extraindo-se do âmbito de proteção de tal normativo a proibição de aplicação analógica de normas incriminadoras, uma interpretação sistemática do texto constitucional aconselha a que esse momento hermenêutico se converta num “pedaço” de normatividade integrante do objeto de controlo. Daqui não resulta que o Tribunal Cons- titucional haja de escrutinar qualquer processo hermenêutico que, em matéria penal ou processual penal, venha a ser adotado a nível infraconstitucional. O iter metodológico seguido pelo tribunal recorrido no apu- ramento do sentido normativo da norma permanece insindicável, não cabendo ao Tribunal Constitucional repassá-lo, mas apenas verificar se foram ultrapassados os limites constitucionais a que esse iter está sujeito em matéria penal, concretamente, a proibição da analogia in malam partem . Este foi, aliás, o entendimento que obteve vencimento no recente Acórdão n.º 186/13 (disponível e m www.tribunalconstitucional.pt ), onde foi apreciada a constitucionalidade da norma constante do artigo 400.º, n.º 1, alínea f ) , do Código de Processo Penal, na interpretação de que havendo uma pena única supe- rior a 8 anos, não pode ser objeto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão, por violação do princípio da legalidade criminal. Apesar das muitas declarações de voto relativas a outros pontos da decisão, formou-se uma maioria sólida no sentido de que o fundamento invocado não devia afetar a admissibilidade do recurso. Destarte, há que tomar conhecimento do objeto do recurso.

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