TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

156 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 12. O artigo 13.º (Princípio da igualdade) da Constituição preceitua que “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei (n.º 1) e que “Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual” (n.º 2). 13. O princípio constitucional da igualdade impõe, portanto, o tratamento igual de situações iguais e o trata- mento diferenciado de situações desiguais. Ou seja, não apenas não proíbe, como exige o tratamento diferenciado de situações que são (materialmente) desiguais. No caso, não procede a comparação entre o estatuto disciplinar dos trabalhadores que exercem funções públi- cas e o RDPSP, ao menos quanto ao instituto, regulado no artigo 38.º, n.º 1, desse diploma legal, em virtude da desigualdade (material) das situações em causa ou, vistas as coisas noutra perspetiva, do específico caráter da fun- ções policiais, sejam elas de ordem, tranquilidade e segurança públicas ou de investigação criminal. Com efeito, o RDPSP tem um âmbito subjetivo e objetivo diverso dos que regem em matéria do estatuto dis- ciplinar dos “trabalhadores que exercem funções públicas” (Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, alterada pelo artigo 44.º do Decreto-Lei n.º 47/2013, de 5 de abril) que decorre precisamente “das exigências próprias das respectivas funções” policiais (Constituição, artigo 270.º). Pois, no plano subjetivo, é aplicável (apenas) “ao pessoal com funções policiais dos quadros da Polícia de Segu- rança Pública (PSP), independentemente da natureza do respectivo vínculo, ainda que se encontre a prestar serviço permanente em outros organismos, em regime de requisição, destacamento, comissão de serviço ou qualquer outro” (RDPSP, artigo 1.º). É, pois, um regime estatutário, do corpo policial da PSP (apenas se aplica ao pessoal com funções policiais), com natureza especial. No plano objetivo, como vimos, as funções da polícia, enquanto órgão auxiliar das funções de soberania e da administração da justiça, investida do monopólio do uso de poderes coercivos, nomeadamente do uso da força, que entra em relação direta e imediata com público, dita que o pessoal policial esteja revestido de atributos de autoridade, prestígio e confiança pública que não são aplicáveis, ao menos com o mesmo grau e intensidade, aos “trabalhadores que exercem funções públicas”. 14. Aliás, a própria lei constitucional trata em preceitos diferentes o “Regime da função pública” (artigo 269.º) e da “Polícia” (artigo 272.º). E, não menos relevante, a lei constitucional consagra uma cláusula de “restrições ao exercí- cio de direitos” (direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e à capacidade eleitoral pas- siva e, em certos caso, do direito à greve) nomeadamente dos agentes dos serviços e das forças de segurança, fundada precisamente nas “exigências próprias das respectivas funções” e que não é aplicável aos demais servidores públicos. 15. Concluímos, pois, que, ao menos no que respeita ao instituto consagrado na norma jurídica constante do artigo 38.º, n.º 1, do RDPSP, em razão das exigências próprias das funções policiais, decorrentes da autoridade, prestígio e confiança pública que devem revestir, não concorre uma igualdade material de situações com os “traba- lhadores que exercem funções públicas”, não havendo aqui, portanto, tratamento desigual de situações material- mente idênticas, pelo que no caso não há violação do princípio constitucional da igualdade. c) O artigo 18.º, n.º 2, da Constituição 16. A disposição constitucional em epígrafe preceitua: “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”. 17. Ora, não há, na verdade, fungibilidade entre as medidas do artigo 38.º, n.º 1, e 74.º, n. os 1, alínea c) , 6 e 7, do RDPSP, passível de legitimar uma leitura desta última como uma “alternativa menos restritiva” daquela primeira. Sobretudo, em virtude do facto da “suspensão preventiva” ter um prazo de vigência que, no limite, não poderá exceder os 180 dias (art. 74.º, n.º 6), o que, em face das circunstâncias do caso, poderá constituir um insuperável entrave para a boa gestão cautelar dos interesses subjacentes ao procedimento, na perspetiva da boa administração da justiça disciplinar.

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