TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

167 acórdão n.º 611/14 relacionadas com a (in)constitucionalidade de normas que sustentam a decretação ou a recusa de providências cautelares administrativas. Quer dizer, o artigo 268.º, n.º 4, conjugado com o artigo 204.º da Constituição não podem deixar de reconhe- cer o poder dos tribunais administrativos, no exercício de funções cautelares, para apreciar a constitucionalidade de normas aplicadas ou a aplicar.  Mas daqui não decorre, necessariamente, que o Tribunal Constitucional detenha poderes para sindicar, em sede de recurso, essa mesma constitucionalidade, quando a questão deva ser de novo apreciada no processo princi- pal, sob pena de esvaziamento do objecto processual deste último. Não se verifica, portanto, violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, dado que a questão de constitu- cionalidade sempre poderá ser apreciada na acção principal, a qual se pronunciará em definitivo. 11. Com efeito, a tramitação célere e simplificada que caracteriza a tutela cautelar administrativa não se coaduna com a admissibilidade de fiscalização da constitucionalidade. Aliás, precisamente com fundamento na sumariedade das providências cautelares administrativas, houve até quem colocasse em causa a admissibilidade de suscitação de questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias por parte dos juízes cautelares nacionais, por estas não se coadunarem com a natureza urgente daquelas (neste sentido, ver Sérvulo Correia / Rui Medeiros / Diniz de Ayala, Vers une protection jurisdictionnelle commune des citoyens en Europe , in Estudos de Direito Processual Administrativo, 2002, Lex, Lisboa, p. 51). Idênticas considerações se podem fazer em relação à apreciação de recursos fundados na inconstitucionalidade de normas aplicadas por decisões cautelares, por parte do Tribunal Constitucional.  Além disso, a provisoriedade das providências cautelares administrativas que significa que estas apenas visam regular determinada situação jurídico-administrativa até ao proferimento de decisão de fundo sobre a questão controvertida, implicaria sempre que a formulação de um juízo, pelo Tribunal Constitucional, de (in)constitucio- nalidade de norma aplicada por um tribunal administrativo, nas vestes de juiz cautelar, constituíria um juízo mera- mente provisório. Isto é, a eventual decisão do Tribunal Constitucional (seja no sentido da inconstitucionalidade ou da não inconstitucionalidade) apenas produziria efeitos jurídicos enquanto não fosse proferida decisão defini- tiva sobre o incidente de inconstitucionalidade suscitado no âmbito da respectiva acção administrativa principal. Aliás, em caso de decretação de providência cautelar administrativa alvo de confirmação por decisão do Tribunal Constitucional, aquela sempre caducará por força de qualquer uma das circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 123.º do CPTA, designadamente, por força do “trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao processo prin- cipal, no caso de ser desfavorável ao requerente” [cfr. alínea f ) ].  Ainda que o Tribunal Constitucional se pronunciasse perfunctoriamente pela inconstitucionalidade de norma aplicada em processo cautelar administrativo, aquela decisão apenas produziria os seus efeitos (ou seja, a desapli- cação da norma em causa) de modo provisório. Esta decisão de desaplicação apenas poderia formar caso julgado formal, restrito ao processo cautelar administrativo, pelo que não poderia afectar a liberdade de apreciação quer do juiz cautelar administrativo, em sede de julgamento da acção administrativa principal, quer do próprio Tribunal Constitucional, caso voltasse a ser chamado a pronunciar-se, em sede de recurso de inconstitucionalidade inter- posto da decisão final da acção administrativa principal, o que não seria admissível.  O juízo do Tribunal Constitucional sobre a (in)constitucionalidade da norma aplicada pela decisão recorrida apenas vigoraria enquanto não fosse julgada definitivamente a questão de (in)constitucionalidade nos autos da acção administrativa principal, o que igualmente não é sustentável.  Entendimento diverso, isto é, admitir a possibilidade de a decisão deste Tribunal formar caso julgado material, conduziria a que o juiz constitucional se substituísse ao juiz do processo principal.  Ora, o sistema de fiscalização da constitucionalidade não se compadece com uma solução em que o juiz constitucional se substitui ao juiz do processo principal nem comporta a possibilidade de decisões de inconstitu- cionalidade provisórias. Por último, o julgamento pelo Tribunal Constitucional, em sede de recurso, sobre uma questão de inconstitu- cionalidade suscitada em autos de providência cautelar administrativa coloca em causa a natureza instrumental das providências cautelares, dado que implica uma antecipação do juízo sobre a inconstitucionalidade de normas a aplicar

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