TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

169 acórdão n.º 611/14 Por outro lado, não obstante a decisão do recurso faça caso julgado, quanto à questão de constitucionalidade, apenas no âmbito do processo em que foi proferida, certo é que “a decisão produz outros efeitos, potenciando ou desencadeando mecanismos de aperfeiçoamento da ordem jurídica através da eliminação de normas inconstitu- cionais” (cfr. José Manuel Sérvulo Correia, op. cit. , p. 70): a criação de um precedente torna obrigatório para o Ministério Público o recurso de novas decisões de aplicação da norma anteriormente julgada inconstitucional e tem, igualmente, a relevância de contar para o efeito previsto no artigo 281.º, n.º 3, da CRP (declaração de incons- titucionalidade de qualquer norma pelo Tribunal Constitucional em três casos concretos). Finalmente, também o argumento de que a tramitação célere e simplificada que caracteriza a tutela cautelar não se ajusta com os tempos próprios da fiscalização de constitucionalidade não procede.» 15. Ponderadas as razões que sustentam as teses em confronto quanto à admissibilidade dos recursos de fiscalização concreta interpostos em processos cautelares, considera-se, na presente situação, proceder a questão prévia suscitada pelo Ministério Público, assim se acompanhando a jurisprudência maioritária deste Tribunal. 15.1. Em primeiro lugar, numa perspetiva intra-sistemática e na relação entre o processo cautelar e principal, a utilidade que se possa retirar de uma eventual decisão de inconstitucionalidade proferida por este Tribunal no processo cautelar revela-se marginal. Desde logo, quanto ao processo da causa, a tutela constitucional será limitada ao tempo da decisão do processo principal, não a condicionando, em qualquer caso. É que não é apenas o juízo de constituciona- lidade que pode divergir, consoante proferido no âmbito do processo cautelar ou no âmbito do processo principal; é a própria decisão de aplicação (ou não aplicação, como in casu ) da norma impugnada que pode mudar no processo principal, resolvendo-se o litígio a final por apelo a outras normas. Num caso como nou- tro, a utilidade da decisão de constitucionalidade mostra-se seriamente afetada, conhecendo como destino o desfecho do processo judicial em curso e revelando-se temporária a produção dos efeitos no próprio caso. É que a natureza incidental da providência cautelar não deixa de se projetar sobre os efeitos da deci- são de constitucionalidade, passando esta a assumir a provisoriedade própria da decisão cautelar e, assim, transmutando-se o juízo (definitivo) de constitucionalidade em juízo incidental. Como se escreveu no Acórdão n.º 442/00, «(…) a circunstância de a mesma norma ser aplicável em ambos os casos é que torna inadmissível o recurso interposto no âmbito da providência cautelar, atento o valor meramente provisório, não da decisão de mérito nela proferida (…), mas do juízo de constitucionali- dade emitido igualmente ao julgar a providência cautelar.» Ora, este juízo incidental de constitucionalidade não se afigura um meio adequado de tutela, como pretendido no Acórdão n.º 624/09. Se não cabe ao juiz constitucional substituir-se ao juiz que irá decidir o processo principal ou condicionar a sua decisão e se não cumpre qualquer antecipação de um eventual juízo de constitucionalidade a recair sobre a mesma norma em sede do processo principal, não se deve ignorar o efeito perturbador na decisão do caso concreto que será trazido pela possibilidade de coexistirem ou de se sucederem duas decisões de constitucionalidade em contradição sobre a mesma norma no âmbito do mesmo processo, consoante a tutela judicial (da mesma situação) for conferida a título cautelar ou a título principal. Acresce que considerar irrecorríveis as decisões cautelares não põe de modo algum em causa o acesso à justiça constitucional, já que sendo a decisão do processo principal passível de recurso de constitucionali- dade, não se mostra sequer afetado o direito de acesso aos tribunais previsto no artigo 20.º da Constituição (na vertente de direito ao recurso de constitucionalidade). Por outro lado, e noutra perspetiva, também se dirá que do direito a uma justiça célere e eficaz, tal como plasmado no n.º 5 do artigo 20.º da Lei Funda- mental, não decorre o imperativo de admissão deste tipo de recursos. Citando ainda o Acórdão n.º 442/00: «Na verdade, a consagração constitucional da necessidade de a lei prever “procedimentos judiciais caracteriza- dos pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses

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