TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

187 acórdão n.º 612/14 número ou números de telefone, o que significa o direito de os manter, no âmbito do mesmo serviço, inde- pendentemente da empresa que o oferece, como expressamente decorre do n.º 1 do artigo 54.º do mesmo diploma legal, para o qual também remete a sindicada alínea ll) do n.º 1 do mesmo artigo 113.º. As normas constantes do Regulamento da Portabilidade limitam-se a determinar «as regras necessárias à execução da portabilidade», assumindo, pois, neste contexto, um caráter verdadeiramente instrumental ou concretizador, pois que as obrigações nele enunciadas, designadamente aquelas cuja violação é imputada à recorrente [artigos 12.º, n.º 7, e 13.º, n.º 2, alíneas c) , d) e f ) , do referido Regulamento], são as estritamente necessárias a assegurar e agilizar o processo técnico de transporte ou portabilidade dos números, a que as empresas que operam no setor das telecomunicações estão expressamente vinculadas por força do que dispõe o n.º 1 do citado artigo 54.º do mesmo diploma legal. Com efeito, estão em causa, no caso vertente, normas que fixam o prazo de resposta a respeitar por parte da empresa que recebe o pedido eletrónico de portabilidade e preveem os fundamentos de rejeição do pedido. A obrigação é apenas uma, a de conceder a portabilidade do número de telefone, caso seja essa a vontade do consumidor, e esta obrigação (principal) está claramente enunciada na norma legal que sanciona a contraordenação decorrente da sua violação; os termos concretos em que tal obrigação deve ser acatada, sendo-lhe inerentes ou decorrentes, nada acrescentam que importe uma nova ou diferente valoração do ilícito contraordenacional em causa e, muito menos, a criação arbitrária pela Administração Pública de novos tipos contraordenacionais, como parece sustentar a recorrente, não sendo demonstração do contrário a alegada ‘legalização’ de obrigações meramente instrumentais que antes se encontravam previstos no regulamento em causa, como a referente ao prazo de resposta do pedido de portabilidade, operada pela Lei n.º 51/2011, de 13 de setembro, que conferiu nova redação ao artigo 54.º do citado Decreto-Lei n.º 5/2004. Por tais razões, também no que respeita à norma em causa, é infundada a arguição de inconstitucio- nalidade que a recorrente lhe dirige com base na violação dos princípios constitucionais da legalidade e tipicidade. Finalmente, defende a recorrente que a concentração, numa mesma entidade administrativa (Anacom), dos poderes de definição autónoma e integral dos elementos do tipo contraordenacional em causa e do res- petivo sancionamento, instruindo e decidindo a prática dessa mesma infração, viola o princípio da separação de poderes e do acusatório previstos nos artigos 2.º e 32.º, n.º 5, da Constituição. Mas também nesta perspetiva é insubsistente a argumentação da recorrente. O legislador não remeteu para a Administração Pública a criação do presente tipo contraordenacional; como demonstrado, o essencial do ilícito contraordenacional configurou-o o legislador ao enunciar no n.º 1 do artigo 54.º da Lei n.º 5/2004, de forma clara e precisa, o conteúdo da obrigação de portabilidade cuja violação é punível como contraordenação, assim imprimindo ao ilícito contraordenacional a matriz que, no que respeita ao dano que se pretende prevenir e reprimir, essencialmente o caracteriza. Por outro lado, o princípio do acusatório, na dimensão subjetiva que impõe a autonomização orgânico- -funcional de quem acusa e de quem decide, é princípio que, valendo no âmbito do processo criminal (artigo 32.º, n.º 5, da Lei Fundamental), não é transponível para o direito contraordenacional. A Administração Pública, que tem o poder de instruir e decidir a final o processo administrativo desen- cadeado com a notícia da prática da infração contraordenacional, não é um órgão jurisdicional, embora desenvolva a sua atuação de acordo com princípios parcialmente comuns àqueles que, nos termos da Consti- tuição e da lei, regulam a atividade jurisdicional, tal como os princípios da justiça e da imparcialidade (artigo 266.º, n.º 1, da Constituição). As garantias de defesa do arguido, nessa fase, são, pois, aquelas que resultam da sujeição da Administração Pública à lei e aos princípios que regulam o exercício do poder sancionatório público que aquela lhe atribui, impondo-lhe, designadamente, o respeito pelo direitos de audiência e defesa do arguido nos processos de contraordenação (artigo 32.º, n.º 10, da Constituição). E assistindo ao arguido, em tais processos sancionatórios, o direito constitucionalmente assegurado de sindicar perante um tribunal o exercício de um tal poder sancionatório, quer no plano formal, quer no plano

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