TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

195 acórdão n.º 639/14 constitucional: todos estes valores detêm igual relevância e todos eles são constitucionalmente protegidos. Ora, quando vinculado por vários valores constitucionais, díspares entre si pelo conteúdo mas iguais entre si pela rele- vância, deve o legislador optar por soluções de concordância prática, de tal modo que das suas escolhas não resulte o sacrifício unilateral de nenhum dos valores em conflito, em benefício exclusivo de outro ou de outros (em idên- tico sentido, mais recentemente, o Acórdão n.º 20/10). Deve reconhecer-se, aliás, que o legislador, no âmbito do processo civil, e por via da reforma de 1996-1997, tem sido sensível à introdução de mecanismos que visem que o processo, pela sua própria estrutura, possa oferecer maiores garantias de justiça. Isso sucede, na parte que agora mais interessa considerar, através da garantia processual estabelecida no artigo 3.º-A do Código de Processo Civil, que confere ao tribunal o dever de assegurar, durante todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso dos meios de defesa e na aplicação de cominações ou sanções processuais, e que tem como concretização, por exemplo, a possibilidade do convite às partes a aperfeiçoarem os seus articulados [artigo 508.º, n.º 1, alínea b) , 2 e 3]. Mas também, no plano da garantia do contraditório, através do reforço do direito de resposta, e, especialmente, por força da regra do artigo 3.º, n.º 3 (com diversos outros afloramentos), que atribui ao juiz, fora dos casos em que a audição da contraparte esteja expressamente prevista, o dever de verificar, em função das circunstâncias do caso, a conveniência de as partes se pronunciarem sobre qualquer questão de direito ou de facto que possa ter relevo para a apreciação e resolução da causa (sobre todos estes aspetos, Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil , Lisboa, 1997, pp. 36 e segs., em especial, 43 e 48). 4. O fomento da celeridade do processo de insolvência foi um dos objetivos do novo Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, como tal expressamente assumido pelo legislador (cfr. n.º 13 da exposição de moti- vos do diploma preambular) e que se pretendeu potenciar através de diversos fatores atinentes quer à estrutura do processo quer à própria tramitação processual, e, neste caso, por via, designadamente, da supressão da duplicação do chamamento de credores ao processo, que agora se concentra numa única fase de citação com vista à reclamação dos respetivos créditos (artigos 37.º e 128.º e segs.). Como se viu, a exigência de indicação dos cinco maiores credores no articulado de oposição do devedor tem justamente em vista permitir a identificação daqueles que, na sequência da prolação da sentença de declaração de insolvência, devam ser citados pessoalmente ou por carta registada para efeito de exercerem o direito de reclamarem os seus créditos. Ao processo de insolvência, ainda que integre o domínio mais geral do processo civil, não pode deixar de reco- nhecer-se uma certa especificidade, que justificou que a sua regulamentação fosse retirada do Código de Processo Civil, onde tradicionalmente se inseria, e coligida num diploma autónomo, através da aprovação, pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de abril, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, depois substituído pelo atual Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Não se põe em dúvida que o legislador dispõe de uma ampla margem de livre conformação para, com base em razões de política legislativa que lhe cabe definir, modelar uma forma de processo que permita dar satisfação, de modo célere e eficaz, aos direitos dos credores. Também não se questiona que o ónus processual imposto ao devedor quando pretenda deduzir oposição ao requerimento de declaração de situação de insolvência – por via da falada norma do artigo 30.º, n.º 2, do CIRE –, não suscita especiais dificuldades de cumprimento, visto que o devedor, pela sua própria condição de sujeito processual passivo, não pode deixar de conhecer os factos relevantes relativos à sua situação patrimonial e está particularmente habilitado a fornecer os elementos de informação que interessam ao prosseguimento do processo. A solução normativa, tal como se conclui no Acórdão n.º 556/08, é suscetível de violar o princípio do processo equitativo, não tanto pelo maior ou menor grau de dificuldade que o cumprimento do ónus pudesse suscitar, mas pelo caráter excessivo da cominação que lhe está associada, quando entretanto nem sequer se admite a possibilidade de suprimento da deficiência do articulado. De facto, o n.º 2 do artigo 30.º do CIRE estabelece um mero requisito formal que se destina a facilitar a identificação pelo tribunal dos credores que devam ser citados pessoalmente ou por carta registada, tendo por isso uma mera função instrumental relativamente ao ulterior desenvolvimento da tramitação processual, em nada

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